segunda-feira, abril 24, 2017

O MEU 25 DE ABRIL DE 1974

Ainda não eram 7,30H da madrugada um amigo telefona-me e diz-me quase sem respirar: pá, não saias de casa que Lisboa está cercada pelos militares, não venhas trabalhar que a tropa não deixa ninguém entrar em Lisboa. Escuta a Rádio, os militares ocuparam o Rádio Clube Português e dizem que está em marcha uma operação militar para derrubar o Marcelo. E repetiu várias vezes que não saísse de casa porque era perigoso. 
Logo pouco depois quis comunicar com familiares moradores em Lisboa para saber mais acerca do que se passava e já não havia telefone. Fiquei a ouvir os comunicados do MFA no RCP que ia dando conta dos avanços e ocupações de instituições governamentais pelos militares revoltosos. 
Também por meio dos comunicados sabia-se que militares apoiantes do regime estavam na rua e por isso que a população ficasse em casa e não se dirigisse para a Capital. 
Entretanto, nos arredores de Lisboa nas ruas onde morava, o povo viera para a rua e não se falava de outra coisa e, face à alegria pressentida de liberdade, todos sentiam vontade de ir ver ao vivo a revolução. Por volta das 10.30H da manhã, eu e a mulher, decidimos ir para Lisboa contra os alertas do MFA, afoitos a tentar estar o mais presente possível junto dos acontecimentos. E fomos, e chegados às Amoreiras pela A5 fomos impedidos de passar pela barreira militar ali instalada. Se já estávamos às portas dos acontecimentos e perante a visão de anormalidade de viaturas militares e tropas de armas na mão em plena rua de Lisboa, e até mais para mim que tinha vindo da Guerra Colonial havia apenas alguns anos, a vontade de assistir a tal estranha e emocionante situação redobrou. E mais ainda, quase o coração saltou do peito e lágrimas dos olhos quando começamos a ver, para lá da barreira militar, grupos de lisboetas com bandeiras em direcção à Baixa aos gritos de "Viva a Liberdade". 
 Não esperámos mais. Fomos pôr o carro num lugar qualquer antes da barreira militar e metemo-nos pelas Amoreiras abaixo em direcçao ao Rato e depois para a Baixa em passo apressado já pelo meio de inúmeros grupos de povo cantando e gritando pelos militares e pela liberdade. Corremos toda a Baixa entre o Terreiro do Paço e o Carmo onde se concentravam o grosso do povo e os militares. 
Por fim fixámo-nos no Carmo e, já a meio da tarde, assistimos à saída da Chaimite que levava o Marcelo prisioneiro, após a rendição, para entregar o poder a Spínola. 
Desaparecida a Chaimite da nossa vista a festa de alegria pela liberdade continuou mas também logo ali alguns levantaram dúvidas acerca de Spínola e do destino de Marcelo, isto é, acerca do futuro após consumada a Revolução.

Etiquetas: