segunda-feira, outubro 16, 2017

COPOS NO PROCÓPIO

 Há qualquer coisa que indicia um malsão e inexistente estado de exceção no espetáculo do ministro das Finanças a entregar ao chefe do parlamento, tarde na noite, o Orçamento para 2018, seguindo depois para uma conferência de imprensa pela uma da manhã. É para apagar mediaticamente os "fogos" de Pedrógão ou as faúlhas de Sócrates? Seja por que motivo for, é preciso dizer de forma clara que, em democracia, as coisas não devem passar-se assim. Há rituais de serenidade e eficácia que devem ser respeitados, para que os cidadãos fiquem com a certeza de que quem os governa não anda "à bout de souffle", que as coisas do Estado estão em boas mãos e são tratadas nas devidas horas, que o tempo dos "homens sem sono" já foi chão que deu uvas. As madrugadas servem para um copo no Procópio, não para coreografias de Estado.

Fonte Blog "duas ou três coisa" por Seixas da Costa

O Senhor Embaixador pelos cantos do mundo e igualmente comentador do mundo pelos cantos e microfones de Portugal saíu-se com esta pérola crítica que, de um golpe, envolve o ministro das Finanças, o Presidente da Assembleia da Répública, o Sócrates, as coisas do Estado, as madrugadas e o Procópio. 

Na sua inusitada e a despropósito crítica salvam-se as madrugadas e o Procópio por que estão, para o Embaixador, adequada e especificamente um para o outro. E lembra-nos que os "homens sem sono" já não existem, foi chão que deu uvas, e certamente pela lógica do seu raciocínio tais homens sem sono hoje em dia vão para o Procópio  beber um copo.

No resto, Centeno, Ferro Rodrigues, Sócrates. o Estado e governo são motivo de censura porque "há rituais de serenidade e eficácia que devem ser respeitados" e de ter-se a certeza "que as coisas do Estado estão em boas mãos e são tratadas nas devidas horas". Segundo o Senhor Embaixador tudo no Estado, hoje em dia, deve ser tratado nas horas de "expediente" com horário de "guichet" estabelecido no contrato colectivo. O Chefe de Estado, os ministros, militares, magistrados e deputados devem respeitar horários contratados estabelecidos como qualquer vulgar funcionário público.

Portanto, o Senhor Embaixador sugere que:

Na madrugada de 25Abril1974 o Salgueiro Maia devia ter ido beber um copo ao Procópio.

As reuniões de Conselho de Ministros se devem fazer durante o horário de serviço de expediente e fora dele devem ir reunir-se no Procópio.

Nas reuniões de Chefes de Estados e Primeiros Ministros na UE o nosso Chefe de Estado e PM devem abandonar essas reuniões logo que elas ultrapassem o horário normal vigente para os funcionários da UE.  

Os militares em operações de guerra ou salvamento devem interromper os seu trabalhos logo que esteja ultrapassado o seu horário normal de serviço. 

A assembleia da Répública e os senhores deputados devem parar sempre os seus trabalhos sempre que esteja ultrapassado o seu horário normal estabelecido pelos próprios deputados e irem todos tomar um copo ou tratar das leis para o Procópio. 

Talvez não fosse por despeito do correto intocável cumpridor Ministro da Finanças mas sim para dar um ar do seu "british" mental cujo mito é: - amanhâ tomo nota disso e falamos -. Mas eu posso dar-lhe um exemplo do "fair-play" mental português, assim:

Em Angola em 1962 estávamos isolados no mato do Mucondo há cinco meses e um  Senhor Capitão aviador quis arrancar do acampamento sem levar uma carta-aerograma que um Soldado estava acabando de escrever porque tinha, argumentou o capitão aviador, de estar na Messe de Oficiais até tal hora em Luanda para jantar e ainda tinha de ir tomar banho antes e poder mais tarde ir tomar uma bica à Versailles. Um Soldado que ouviu tais argumentos face ao seu estado de isolamento cercado pelo inimigo 24 sob 24 horas sob condições mínimas de higiene e alimentação, puxou da arma a dois palmos do capitão piloto e gritou; o meu capitão não toca em um botão do avião ou leva já um tiro e fica aí para sempre tombado ao volante do seu avião. E a carta seguiu mesmo meia hora depois e o Capitão percebeu o recado e arrancou para Luanda contente do dever cumprido.   

O recado do Senhor Embaixador é, precisamento, o oposto daquele do Soldado naquela tarde-à-noitinha no Mucondo. E mais parece o resultado de Procópio a mais e senso a menos.

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3 Comments:

Blogger Francisco Seixas da Costa said...

Não sabia que estávamos em guerra, desculpe.

10:43 da manhã  
Blogger josé neves said...

De jure não estamos mas de facto estamos metidos em várias guerras e a mais violenta, actualmente, é a dos fogos mas também já tivemos mortos nas missões militares lá fora.
A história verídica de guerra que contei era apenas demonstrativa do estilo diferente entre a maneira "british fleumática de encarar os problemas e a nossa maneira portuguesa pouco racional e simultâneamente mostrar que a noite pode ter as mais inesperadas facetas mas, face às grandes questões que podem pôr-se na noite, a menos importante e até supérflua será sempre a do "copo" por mais sentimental e gratificante que seja a tertúlia anexa.
Quanto a homens sem sono veja o que se passa com bombeiros e toda a equipa de comando e logística e até com ministros e mesmo com António Costa a falar ao país às 02,30H em plena madrugada de segunda-feira.
Ao contrário do que diz, penso, que há e necessariamente haverá cada vez mais "homens sem sono". Pois cada vez mais a vida activa se transfere para a noite ou seja cada vez mais as cidades se parecem mais com Nova York: uma Cidade que não dorme exige igualmente gente que trabalha e vela por ela à noite.
É minha opinião que a sua mensagem no post em causa foi algo tratado com muita leveza ao contrário de muitos outros que costumo ler. E sem desculpa.

9:42 da manhã  
Blogger Francisco Seixas da Costa said...

Reitero a minha perceção de que, em questões de rotina democrática, as instituições devem funcionar “à sueca”, em que os governantes, que entram ao trabalho às 8, saem em regra às 17. Os debates parlamentares pela noite dentro, as comissões da AR cheias de olheiras, este “presentismo” saloio até altas horas é um sinal de “terceiro-mundismo”. Não confunda, com dolo, a cena do OGE com os fogos ou com as guerras.

5:15 da tarde  

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