terça-feira, agosto 14, 2007

MONUMENTO AO "MOTARD"


A CULTURA APEADA

Tinha ouvido falar de um monumento ao "motard" a instalar na cidade de Faro o que considerei uma idéia de gosto duvidoso. Afinal o monumento já existe junto à rotunda situada entre a Cadeia e o Teatro das Figuras. Porquê um monumento ao "motard"? E porque não ao automobilista que sofre as agruras da entrada e saída da cidade, do estacionamento e das multas e mesmo assim continua a utilizar o carro, a carrinha, o camião ao serviço da economia da cidade? E porque não ao carroceiro que transportou durante séculos a cidade em pedras, uma a uma, desde as pedreiras? E porque não ao artífice ciclista que durante meio século se dirigia ciclistica e diáriamente à cidade para erigir as suas casas, ruas e praças? E porque não ao futebolista do Farense que durante décadas encheu de gente o estádio de S. Luis, as ruas, cafés e restaurantes e publicitava a cidade todas as semanas nos jornais e televisões?
Representa o "motard" uma cultura superior à do automobilista, carroceiro, pedreiro ou futebolista? Mas se o monumento se dirige à cultura "motard" esta só estará representada integralmente num conjunto que estabeleça a relação íntima mota-motard que implique o pensamento numa especificidade cultural do modo de encarar a vida sobre duas rodas. Ora o monumento apenas reproduz uma das peças desse dueto, a máquina, ou seja a parte material, passiva e por conseguinte incapaz de por si criar uma idéia de cultura viva, actuante prática. O que ali está é uma cultura apeada do seu elemento criador, é uma natureza morta que tal qual a lata de sopa de Warhol representa um ícone comercial, e nesse sentido ilustrativo da actual sociedade de consumo.
Pela frieza metálica dos elementos, pela sua composição plástica, induz-nos a pensar na máquina mota mais como instrumento arrojado de risco de vida; a mota lançada sobre a estrada curta em rampa e ao lado outra estrada identica, longa e direccionada para o alto. Faz lembrar que a vida sobre duas rodas de "motard" pode ser curta e está permanentemente apontada ao céu.
Faro, diz-se, quer ser capital da cultura mas com implantação de monumentos deste tipo só poderá ser capital da cultura de feira e arraial, isto é de arte de efeito comercial apeada de conhecimento e identidade cultural.