segunda-feira, maio 18, 2009

DETERMINISMO E RUPTURA II


SÃO OPOSTOS
Muitos há que ensinam e muitos há pensando, levados por tal ensinamento, que o capitalismo foi um modelo inventado por um qualquer sábio social ou filósofo dedicado estudioso de modelos de sociedade. Esta ideia é inculcada e aceite com facilidade pelos crentes que se limitam a ouvir a missa sem lerem criticamente os textos canónicos do respectico credo. Os crentes, tal como pensam que Marx chegou ao marxismo por via de sua pura imaginação sem mais, pensam por comparação, que o capitalismo foi uma invenção imaginada por um filósofo fascista implantado à força por reis e imperadores malvados.

O estudo da evolução do progresso humano, segundo Lewis H. Morgan no seu estudo e obra fundamentada "A Sociedade Primitiva", na qual Engels se baseou quase exclusivamente para o seu trabalho "A Origem da Família da Propriedade e do Estado", conclui que no princípio existiu o "Estado Selvagem" comportando :
Fase inferior. Coincide com a infância da raça humana, alimentação de frutos e nozes, primeiras tentativas de linguagem articulada. Vida em habitat primitivo em regiões muito limitadas.
Fase média. Começa com o consumo de peixe e o uso do fogo, expandem-se pela maior parte da superfície da terra.
Fase superior. Tem início com a invenção do arco e flecha e do homem feito caçador profissional exímio.
Segue-se o período da "Barbárie" comportando:
Fase inferior. Sendo de difícil demarcação a transição do estado selvagem para a barbárie, o autor considera a invenção e uso da cerâmica como critério mais seguro para marcar essa transição.
Fase média. Começa com a domesticação de animais e com a irrigação na agricultura e invenção do tijolo seco ao sol e da pedra para uso na construção.
Fase superior. Começa com a produção e uso de objectos de ferro. Nesta fase viviam as tribos gregas da época de Homero.
Por fim chegamos ao "Estado Civilizado" que começa com o uso de um alfabeto fonético e com a produção de obras literárias que se divide em antigo e moderno.

Em toda a história da humanidade não houve mais que dois sistemas bem organizados e definidos de sociedade. O primeiro e mais antigo, surgido no período do estado selvagem, foi uma organização social fundada sobre as gens, as fratrias e as tribos, origem da sociedade gentílica baseada em relações pessoais de consanguínidade que se manteve até ao advento do estado civilizado; o segundo nascido no período do estado civilizado antigo, fundada sobre relações de território e propriedade que originou uma sociedade política e corresponde à sociedade moderna.
A gens primitiva constituia uma fraternidade cujos membros estavam ligados entre si por laços de parentesco, inicialmente por via matrilinear e depois patrilinear. Os princípios de liberdade, igualdade e fraternidade, sem nunca terem sido explicitamente formulados, eram os princípios fundamentais que regiam e se praticavam na vida da gens. O facto do seu aparecimento e manutenção durante períodos pré-históricos tão longos, demonstra a que ponto esta organização social estava adaptada às necessidades do desenvolvimento organizado da humanidade do tempo.

A sociedade gentílica vivia numa relação de comunidade com a maioria dos bens em regime de co-propriedade, onde os direitos de posse eram a título de usofruto; quando se desistia dos bens estes eram devolvidos à gens. Foi este modo de vida comunitário que Engels traduziu para a sua linguagem marxista assim: - "a economia doméstica é administrada em comum por uma série de famílias e de modo comunista; a terra é propriedade da tribo"-, e depois continua, -"são os próprios interessados que resolvem as questões; e na maioria dos casos, costumes seculares já tudo regulam"-. E prossegue, -"Não pode haver pobres nem necessitados; a família comunista e a gens têm consciência das sus obrigações para com os anciãos, enfermos e inválidos de guerra. Todos são iguais e livres, inclusive as mulheres"-.

Por conseguinte, Engels foi buscar como exempolo de sociedade comunista a gens primitivas dos tempos selvagem e da barbárie cujas relações eram familiares com base nos vínculos de sangue por via matriacal ou patriacal, dado que à entrada dos tempos civilizados, quer a tribo de gens gregas quer a curia de gens romanas já não mantinham laços apertados de consanguínidade mas sobretudo laços territoriais comuns. A gens tinha evoluido da forma arcaica para a sua forma acabada, devido à pressão de novas ideias e novas necessidades. As exigências imperiosas de uma sociedade em progresso tinham-lhe imposto várias transformações e obrigariam a maiores e mais substanciais ainda. A pequenês da gens, cerca de trinta famílias, face às necessidades de terras, de defesa, de alargar espaços matrimoniais, levou-a a juntarem-se, em grupos de trinta gens, e formaram as fratrias e estas uniram-se três a três e formaram as tribos. A organização social da tribo originou a delimitação de um território comum a que deram o nome de demos ou município que iria tornar-se a unidade de organização do novo sistema de governo. Desde agora, a posição do gentílico convertido em cidadão ia definir-se em relação ao Estado na base da sua situação territorial e já não na base da sua situação no seio da gens. Estavam criadas as condições para o surgimento de grandes aglomerados urbanos e o necessário aparecimento do governo da polis e do Estado moderno.

Morgan estabelece períodos pré-históricos e data o seu aparecimento por invenções do engenho humano que marcaram esses períodos ou etapas da caminhada humana. Fa-lo mais por questões de tornar entendível a evolução da humanidade, porquanto ele diz-nos que todos esses períodos co-existiram até à modernidade: quando os espanhóis ocuparam a América ainda as tribos índias viviam perto do regime das gens primitivas. Prova o levantamento de Lewis Morgan, sobre a nossa evolução, que nunca houve em qualquer tempo da existência humana uma qualquer alteração abrupta ou descontinuidade da organização social existente em cada tempo pré-histórico. Nem nenhuma das mais importantes invenções e conquistas alcançadas provocaram qualquer ruptura no prosseguimento evolutivo na nossa lenta caminhada para a actualidade. Nem isso era possível devido á inexistência de uma consciência polico-social do homem primitivo nem foi possivel quando o homem adquiriu, racionalizou e estudou essa consciência político-social ao ponto de filósofos iluminados congeminarem organizações sociais de ruptura com as fórmulas existentes, alcançadas por via da inevitável continuidade do corpo social, e que ao serem postas em prática se revelaram verdadeiras utopias sujeitas ao fracasso mais desastrado. Foi o caso de Pitágoras em Crotona, de Empédocles em Agrigento e por fim de Platão em Siracusa; todos recebidos em grande honra e respeito pelo alto saber académico comprovado, foram emcarregados de pôr em prática, nas respectivas pólis, os seus conhecimentos teóricos sobre a organização do estado e do povo para obter a cidade ideal. Acabaram todos sendo corridos e perseguidos quer pelos estados que os tinham chamado quer pelos povos que não se sujeitaram, por incompreensão, medo e impossibilidade mental, a alterar abruptamente o seu curso e modo de vida. O mesmo quase aconteceu com Esparta onde Licurgo legislou no sentido de fabricar um povo de guerreiros, o que conseguiu até certo ponto, mas que posteriormente foi uma derrocada total, não deixando Esparta à posteridade nada alem de algum feito guerreiro momentâneo.

O mesmo aconteceu com a experiência utópica marxista-leninista do séc. xx que Engels teorizara a partir do exemplo da gens, uma organização social primitiva que se revelara boa e duradoira para um agrupamento parental de cerca de tinta famílias. E mesmo no caso da gens a organização, sendo comunitária estava longe de ser do tipo comunista e muito menos marxista-leninista comandada por uma ditadura imposta e dirigista sem apelo. Na vida da gens, dada a sua dimensão e familiaridade, a sua coesão e identidade de vínculo pelo sangue fazia todos iguais e igualmente livres tornando inadmissível qualquer dirigismo elitista imposto.
A consciência da humanidade não vai à frente nem atrás do conhecimento dessa humanidade em cada tempo, vai a par com o conhecimento e desenvolvimento cultural, técnico e científico que já entendeu e interiorizou e que já o serve e utiliza. Querer dar saltos para o futuro abruptamente em ruptura total e frontal com o presente é como querer interromper a corrente do pensamento e por conseguinte provocar um colapso de consciência nos indivíduos. Todas as tentativas de saltos utópicos saldaram-se ao preço de rios de samgue humano, para nada.

Etiquetas:

1 Comments:

Blogger Diogo Sousa said...

Inteiramente de acordo com o autor..
Revolucoes nao sao mais que solancos na viagem do homem...mudancas radicais raramente nao teem o preco do sangue...sao experiencias custosas.
Abraco e parabens pelo post.
dcs

6:10 da manhã  

Enviar um comentário

<< Home