MANUEL ANDRADE, TI'ANDRADE
Conheci o Manuel Andrade já ele era há anos o Ti'Andrate, um homem já algo alquebrado dos trabalhos duros de cavador e trabalhador na lavoura da terra e do varejo dos frutos secos do Barrocal algarvio.
A vida dura constante e pouco sua amiga amargurara-lhe o sentir da alma que o estimulava para a sua sensibilidade poética à maneira de António Aleixo que escutava sempre que o grande poeta popular vinha aos Gorjões cantar e vender as suas "lindas Quadras".
Em jovem foi um mancebo forte e garboso que se exibia a levantar pesos como sacas cheias, grandes pedregulhos, cadeiras com homens sentados nelas e, sobretudo no fim do "balhos" (bailes) no "jogo do teso" no qual era um dos campeões.
Tal como o gorjonense Wenceslau Pinto o retratou em 1945 desde jovem que usou chapéu às duas pancadas, uma à frente e outra atrás, e fumava de cachimbo de fabrico próprio que foi sua companhia até ao fim do seu tempo.
O Poeta Aleixo já o conhecia de o ouvir dizer as suas próprias poesias de memória, pois tal como o poeta Aleixo também era analfabeto, e um dia frente a frente, de repente, atirou-lhe a seguinte quadra, assim;
O cachimbo do Ti'Andrade
Parece mesmo uma caldeira
Nem que ardesse uma cidade
Deitava tanta fumaceira.
De todas as poesias em quadras populares que concebeu nada resta além de alguma que o povo adoptou e fez passar de boca em boca entre gerações. Está neste caso a célebre quadra de sua autoria que fala de si e diz;
Já fui o Manuel Andrade
Hoje o Ti' Andrade sou
Sou o mesmo é bem verdade
Só tempo é que passou.
Há anos encontrei nos papéis de gaveta do Mestre Bota, o barbeiro da terra e do Ti'Andrade, uma quadra de sua autoria que o Mestre barbeiro dactilografara para memória futura a qual chegou agora o tempo de recordar e inscrever no futuro;
Mote
Almoço, jantar e ceia
Chapéu, boné e barrete
Tôca, chinó e tapiço
Jaqueta, calça e colete
1º-
Rapazes, homens e mulheres
Ginjas, peras e cerejas
Capelas, ermidas e igrejas
Garfos, facas e colheres
Sargentos, capitães e alferes
Bonita, formosa e feia
Camisa, ceroula e meia
Tarrina, chícaras e pratos
Botins, botas e sapatos
Almoço, jantar e ceia.
2º-
Cuco, gaio e papa-figo
Pardais, arvelas e andorinhas
Quintas, olivais e vinhas
Centeio, cevada e trigo
Prisão, crime e castigo
Chocolate, café e leite
Pimento, vinagre e azeite
Moinhos azenhas e atafonas
Salada, pão e azeitonas
Chapéu, boné e barrete.
3ª-
Tijelas, testos e panelas
Alforges, manta e cajado
Roxo, branco e encarnado
Azul, vermelho e amarela
Porta, postigo e janela
Amor, carinho e derriço
Touchinho, paio e chouriço
Patetas, asnos e tolas
Cavalos, cartas e bolas
Tôca, chinó e tapiço.
4ª-
Velhas, freiras e beatas
Direitos, tortos e zarolhos
Nabos, couves e repolhos
Ladrilhos, ladrões e magnatas
Ervilhas, favas e batatas
Espada, traçado e florete
Bomba, rastilho e foguete
Jardins, salas e regalos
Burros, éguas e cavalos
Jaqueta, calça e colete.
Etiquetas: tempo de pandemia e confinamento; regresso às memórias: ti'andrade.
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