quinta-feira, julho 08, 2021

O DELGADO, A "FORÇA G" E O ACIDENTE COM O CABRITA

 
Luis Delgado escreveu na "Visão" esta pérola acerca da sua descoberta no âmbito da Física de uma nova lei da "Dinâmica" de sua lavra: 

«É preciso acabar com esta farsa: a que velocidade ia o carro, e quem mandou, ou não se importou que fosse excessiva? Não há ninguém, em carro nenhum, que não se aperceba quando circula a alta velocidade. Não há como. A força G sente-se no corpo.

Mas muitos mais opinadores manipuladores ou ignorantes discorrem horas sobre horas na tv acerca da velocidade a que seguia o carro do ministro Cabrita para daí deduzirem acerca da culpabilidade do mesmo; afinal, ir a mais de 120-140 Km/h na auto-estrada é ilegal segundo o Código de Estrada, logo se ia a 200Km/h ou mais, como repetem entusiasmados os juízes de tasca e tv, então o ministro cometeu um crime, é culpado e deve ser preso ou, como repetem, já devia estar preso há muito tempo pelo que fez e não devia ter feito ou pelo que não fez e devia ter feito; usam o truque da eventual ilegalidade do excesso de velocidade para conectar isso com a culpa do acidente que matou o trabalhador; um velho truque de barbas para manipular gente simples que faz automaticamente tal conexão mental; se culpado pelo excesso de velocidade tal excesso há-de ser, de algum modo, também culpado pelo acidente e morte do trabalhador; este é o raciocínio que pretendem impingir ao "povão" os conscientes opinadores manipuladores.

A inventada "Força G" referida pelo Delgado será a "Força da Gravidade" de aceleração  constante e igual para corpos em queda livre que, no caso, não conta; o que ele sente quando vai num carro é a "Força de Inércia" que o empurra para trás contra o banco ou o projecta violentamente prá frente quando trava, bate numa parede ou noutro  carro; botar no papel o palavrão "Força G", sem mais, é para armar em cientista e obter um valor de opinião acrescida junto de pessoas simples ou ignorantes. 

Deixemos a inventiva idiotice do Delgado como a de tantos outros iguais que exibem as mais variadas e destrambelhadas teses acerca da "força G" ou da "alta velocidade" evidente por que não viu o homem na beira, porque nem travou, porque o homem foi atirado até tantos metros de distância, porque isto e aquilo e até porque não saíram do carro imediatamente, porque não prestaram os primeiros socorros, porque não foram, na hora, pedir desculpa à viúva e sei lá quantas mais imoralidades são tratadas como provas de "culpas" atiradas ao ministro. 

Só que o facto fundamental do acidente acontecido ninguém questiona; porquê o trabalhador precisamente no instante que passava o carro se meteu na faixa de rodagem? Porque carga de água o trabalhador, experiente naquele trabalho, não teve a precaução mínima de lançar um olhar ao transito antes de meter o corpo na faixa de rodagem? Ele sim, como trabalhador experiente a operar em serviço na auto-estrada, tem o dever e obrigação de seguir todas as cautelas e precauções de segurança quando atravessa as faixas de rodagem livres para a circulação do transito, ou não?

A grande mistificação neste caso é tornar o acidente dependente da velocidade; mas em que é que o acidente é consequência da velocidade se o carro circulava na faixa normalmente? Naquele instante colidiram, ou coincidiram no tempo e local, o trabalhador e o carro; ora é verdade que se o carro visse mais lento evitava a colisão mas, se viesse mais rápido também a evitava; isto é, para não haver colisão tanto podia ir mais lento como mais rápido; muitos de nós conhecem de experiência própria casos de carros a rodar na auto-estrada a velocidade reduzida os quais se tornam um embaraço e um perigo tanto ou maior do que os que conduzem em excesso de velocidade. 

Na realidade, a velocidade dentro de limites controláveis em qualquer estrada nada tem a ver com um acidente com alguém que de surpresa surja repentinamente a travessar a faixa de rodagem; quanto muito a velocidade poderá minimizar os efeitos da colisão; e assim em todos os casos deste tipo; por isso se chama de "acidente"; um facto acidental, imprevisível e, no caso, toda a imprevisibilidade advém do passo do trabalhador dado da berma para a faixa de rodagem; pois ninguém condutor que role numa auto-estrada, mesmo vendo alguém em trabalhos na dita, suspeita minimamente que um daqueles trabalhadores se meta a atravessar a faixa de rodagem de alta velocidade no momento que vai a passar; naquele caso a prioridade é sempre do condutor e ao trabalhador compete obrigatoriamente respeitar o direito de prioridade.   

É tão estranho o caso que, como diz o povo, parece que houve uma "tentação" de forças do mal; o administrador da empresa contratante do trabalhador também se expressa pela total incompreensão da actitude do seu trabalhador, para mais, com seis anos de experiência naqueles trabalhos sem faltas ou reparos. 

Entre tantas e imaginativas teses físicas e morais explicativas do acidente, afinal, talvez mesmo a sua causa obscura, esotérica, predestinada esteja ligada a uma mitológica "Força G"; a força que age sobre um homem e relacionada com o "Mito de Gilgamesh"; a crença num projecto de tentativa de vencer a morte e alcançar a imortalidade; tragédia da vida e da morte.

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