quinta-feira, maio 31, 2018

LICEU DE FARO; 70 ANOS E ANTIGOS ALUNOS

Os ''Antigos Alunos" do tempo que se designava esta Escola como Liceu Nacional de Faro reuniram-se no passado dia 26 deste mês para celebrarem os seus já tradicionais "almoços de Maio dos Antigos Alunos" como também comemorar os 70 (setenta) anos da inauguração desta vetusta Escola.
Hoje designada como "Escola João de Deus" mostra-se aos actuais alunos e professores como uma nova Escola pois foi fortemente remodelada com novos espaços, edifícios, equipamentos e materiais mas, sobretudo, adaptada e equipada segundo os modernos conceitos didáticos.
Mas verdadeiramente nova era quando foi inaugurada em 1948 depois de dois anos que durou a sua construção  pelo empreiteiro Eduardo Pinto Contreiras, ilustre gorjonense. E ainda verdadeiramente nova e um espanto quase aterrador era em 1950 para quem, aos dez anos, ido do Barrocal entrou pelos enormes portões e escadarias e se viu perdido sem saber porque corredor seguir ou porta se dirigir face à profusão de portas, corredores e escadarias que via pela frente embora sabendo, de certeza certa, que ia lá para fazer o exame de admissão.
Um surto de "tinha" que surgiu nesse ano não permitiu a entrada nesse ano de 1950 mas logo no ano seguinte depois de uma tratamento e cura de meses em Lisboa.
E, no ano escolar de 1951 tiveram início as aventuras liceais que foram origem de outras aventuras escolares e estas origem de outras aventuras e histórias de vida até hoje.
Começaram com o aviso solene do Pai que rezava assim: vais estudar mas logo que chumbes um ano vais trabalhar.
Entrei para a Turma A onde fazia companhia ao Passos Valente, Gastão Cruz, Romero Magalhães e mais uma série de estudantes "feras" que discutiam o Português e os clássicos com poucos a entender de que falavam.
Quando abri a boca pela primeira vez para responder a uma pergunta do Dr. Prudêncio este gritou alto na sala de aula: olha, este é montanheiro! E não mais me chamou pelo meu nome próprio.
A Dra. Olinda de Português, que ficava embasbacada com as discussões literárias entre Passos Valente e Gastão Cruz e não ligava a mais ninguém, um dia mandou fazer uma redacção cujo tema era 'contar uma ida ao cinema e história da fita'. Calculem o embaraço, eu que nunca tinha ido ao cinema. Tive de contar uma história do Mandraque que tinha lido nos 'Mosquitos', cadernos semanais de histórias aos quadradinhos, que o meu irmão mais velho comprava. Apanhei um 'sofrível menos" e foi, que me lembre, a única nota positiva que alguma vez tive em Português enquanto aluno efectivo do Liceu.
Tive sempre grandes dificuldades no Português, e também  no Francês e Matemática mas, dada a benevolência do Dr. Magalhães a Francês, fui passando os anos.
Tornei-me um aluno 'sofrível -' mas, simultâneamente, era o melhor e o rei do recreio e, juntamente com o Daniel Alegria, era o melhor no futebol do 'campo dos marinheiros' e no campo dos 'blocos' junto à praia dos estudantes.
Os amantes dos jogos e desportos formaram um grupo de amigos muito unidos dos quais faziam parte o Santaninha de Grenoble, o Dinis Sebastião da Cortelha, o Monteirinho, o Xico Dias de Alcoutim, o Daniel Alegria que vivia frente ao Liceu e era o dono da bola, o Xavier, o Tabeta guarda redes e muitos outros que todas as tardes iam para o "campo dos marinheiros" e o estudo que esperasse. O Botelheiro e os irmãos gémeos Seruca também apareciam algumas vezes.    
Consegui passar o 1º Ciclo e acompanhar sempre aquela turma de alunos brilhantes da Turma A e, como me tornara o rei dos jogos de recreio, era muito requisitado por todos, pelo que, tornei-me respeitado e amigo de todos independentemente das notas. Até fazia equipa com o Passos Valente, Gastão Cruz, Magalhães e outros ilustres alunos no jogo do 'hoquei' improvisado com um stick de cabo de vassoura e bolas de matraquilhos na varanda da casa do Dr. Magalhães.
Participei nas manifestações desfilando pela Rua de Stº. António aos gritos de "liberdade para o Merdock" e fui ver a exposição do Sidónio no Hotel Aliança com o quadro da "macaca com cabeça de pai Tomás" à beira de um precipício que tiveram intervenção da Pide e foram motivo de brado político na época em Faro.
No 2º Ciclo juntou-se a dificuldade do Inglês, diga-se de passagem que até hoje, mas com a Dra. Cabrita, excelente professora e pedagoga e a ajuda do Filipe de Brito, neto de gorjonenses, lá fui passando e chegar ao fim do 5º ano mas, aqui chegado, dado que continuava sem notas a três disciplinas, o Director do 2º Ciclo, Dr. Luís Afonso (O Arame) que nunca foi meu professor, não me deixou ir a exame.

O Pai cumpriu a sua promessa. Fui trabalhar para as estradas com o mano Eduardo Pinto Contreiras, construtor do Liceu, e tudo aquilo que deixei perdido no Liceu naquele dia encontrei, pouco tempo depois, em mim próprio e foi a minha vez de, como autodidata e trabalhador-estudante, cumprir o desejo do Pai.
Tal como a actual Escola João de Deus está marcada pela estrutura original e materiais nobres usados na sua construção inicial, como é exemplo a rosada "brecha de Tavira" que ainda ornamenta as escadarias e algumas paredes interiores e que fora proposta pelo empreiteiro e aceite pelo Engº. Duarte Pacheco após visita às pedreiras, também os antigos alunos foram marcados na sua estrutura mental após submetidos à grandeza daquela Escola e do Saber e Conhecimento nela pressentidos.

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1 Comments:

Blogger HFR said...

Excelente texto. E um bom contributo para as memórias da cidade.
Abraço.
Hélder Raimundo

3:06 da tarde  

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