A "QUESTÃO BORDEIRENSE": UMA TESE (3)
E a "tradição" nasceu e cresceu sucessivamente com a fundação dos Grupos Charoleiros "Mocidade União" em
1918 e "União Bordeirense" fundada em 1919 pelo próprio Mestre José
Ferreiro culminando em 1937 com a fundação da Sociedade Recreativa
Bordeirense enquanto, em simultâneo, compunha as extraordinárias criações
inigualáveis de corridinhos e da célebre, já referida, Marcha de Bordeira.
António Vitorino Pereira no seu estudo de investigação
sociológica sobre o povo de Bordeira refere esse período assim:
"Pode-se dizer que entre os
anos 20 e o final dos anos 40, Bordeira viveu a sua "idade de ouro" de
construção da tradição e de afirmação identitária a que hoje se refere
todo o imaginário colectivo" e continua, "É durante este período entre
as duas guerras, nomeadamente com Mestre José Ferreiro, acordeonista e
António Aleixo, um dos maiores poetas populares portugueses que aqui
passava largas temporadas e ambos autores do Hino da Sociedade, que se
vão escrever e gravar na memória dos mais velhos algumas das melhores
recordações bordeirenses."
Ora esta "tradição" fundadora única e
respeitada impôs-se por si própria dada a inovação e valor incontestável
da música do Mestre que, para além de ser o pai fundador, era uma
figura de elevadas qualidades humanas tão respeitado quer por
bordeirenses quer por todos que alguma vez o conheceram ou conviveram com ele.
A
sua elevada estatura como criatura e criador foi-lhe reconhecida por
todos face ao valor único do seu trabalho e grande bondade e humildade
pessoal sem necessidade de recorrer, nunca, a afirmações e atitudes de
ostentação individualistas em oposição a outrem.
Portanto a
"tradição" original fundadora nasceu de forma natural de seu valor
intrínseco sem o mais leve indício de ter recorrido, alguma vez, ao
discurso do auto-elogio por contraposição com os de fora.
A "Alma"
do Mestre, transbordante de música e valores nobres de combatente na guerra em França,
transbordou e fez-se semente de seara única que inundou sua terra
natal e nela fecundou uma "tradição" de valores e costumes incomuns num pequeno povo de um lugar perdido no mundo.
É muito provável que tal semente, de germinação tão forte e rápida, tenha sido lançada no local ideal onde se mantinha latente alguma certa predesposição social comunitária no sentido de entreajuda e da auto-suficiência pois há rumores de afrontamentos antigos de natureza político-religiosos.
Talvez em algum tempo arcaico, acontecimentos já sem data, tenham deixado pegadas na "alma" dos primitivos locais que se transmitiram pelos costumes tão imperceptíveis como a naturalidade e profundidade de uma reminiscência mitológica de terra prometida.
Mas, acima de tudo e todos, a Alma do
Mestre era tão grande que a pôde repartir pelo seu lugar natal, pelos
lugares vizinhos pelo país e pelo mundo, e sempre bem-vinda, sob a forma de música tecida de Alma e feita corridinhos, hinos e marchas sem nunca perder, dar ou vender a sua
própria Alma em troca de qualquer imaginada futura tradição e, muito menos, de pendor narcísico.
E tão forte e inamovível como se fora um sistema gravítico local que atrai todos bordeirenses à substancia da sua Alma fundadora e inspiradora.
Etiquetas: a "questão bordeirense"
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