sexta-feira, outubro 02, 2020

PODE A IDIOTICE VENCER A INTELIGÊNCIA?

 Os homens já usaram de muitas formas de inteligência e poder para dominarem outros homens. Provavelmente desde que dois homens se juntaram para viver juntos em luta e defesa comum que um deles se tornou mais influente e dominante na relação. Foi assim sempre, depois, nas relações sociais de poder em todas as comunidades primitivas até ao surgimento da Democracia do Contracto Social. 

Esta conduta entre os homens é própria da sua natureza e condição animal e só cultural e civilizacionalmente, digamos, que darwinamente o homem vai desenvolvendo, adquirindo e evoluindo como humanidade. É um erro crasso pensar que o homem por um método político, religioso, psicanalítico, revolucionário, democrático ou absolutista, tirânico idiota ou esclarecido, brutal ou piedoso, reino de reis ou de deuses, de senhores ou de escravos pode mudar a natureza original do homem que existe. Pode esse mesmo homem sujeitar-se e ajustar-se pela força a qualquer um desses regimes; é um facto histórico que ao longo da existência humana na Terra esse homem já viveu e sofreu sob todos esses tipos de formas autoritárias e desumanas e, contudo, o mesmo homem mantém a mesma vontade de liberdade animal original. O filósofo Sartre disse que o homem está condenado a ser livre e o homem vulgar de rua diz que o homem não é pássaro de gaiola, o equivalente do filósofo expresso pelo homem comum.

Claro que a natureza do homem não nega a utopia tal como proclamam outros homens, precisamente, aqueles que pensam possível impor a utopia unilateralmente por meio de um método social ou científico, o qual, degenera sempre num sistema violento de senhores e escravos. A utopia que faz do homem um permanente insatisfeito é o regresso à liberdade original natural perdida; o instinto de regresso ao seu estado primordial de animal em liberdade é algo semelhante ao que a religião descreve como o desejo de regresso ao paraíso perdido por motivo do pecado original. Na sociedade humana, originariamente não religiosa, e consequentemente, sem qualquer noção de ideia moral e muito menos de pecado original ou outro a origem de sua utopia genética foi a irreversível perda de liberdade individual quando a necessidade o obrigou a aliar-se a outros homens e a viver em comunidade de defesa e trabalhos comuns pela sobrevivência, isto é, o chamado "contrato social" implícito na vida comunitária.

A alienação de parte de sua liberdade primordial por motivo do "contrato social" originou a dialéctica histórica, ou luta entre senhores e escravos, ou luta de classes ou simplesmente revoltas e revoluções constantes; ainda hoje é assim. E, nessa luta, cada parte usa dos meios de que dispõe para vencer. Claro os poderosos sempre souberam obter e apoderar-se dos meios mais fortes de persuasão, dissuasão ou imposição; ter em sua mão os meios coercivos e de repressão por um lado e os meios de educação e propaganda fazedores de opinião dominante por outro lado, isto é, o domínio do Estado e dos escribas autorizados. Ao grosso do povo restava ser a grande maioria que metia medo e respeito como multidão possível de revolta contra a miséria imposta, tantas vezes, como medida repressiva de contenção.             

Disse Marx que a história se repete primeiro como tragédia e depois como farsa, contudo, o nosso tempo ameaça inverter o ciclo pois quer envolver o mundo numa gigantesca farsa de produção, promoção e inundação de mentes pervertidas acerca do sentido humano que transporta consigo todos os velhos princípios e valores deitados no caixote do lixo da história agora, reciclados, prontos como adequados para reciclar a própria história por meio de uma tragédia de loucos à escala global.

E os loucos poderosos, que avaliam os seus méritos pelo seu grau de loucura e estão sempre convictos de que a sua visão é justa e as contrárias estão sempre erradas andam por aí, como dirigentes máximos de grandes e influentes países, a querer impor a outros países e ao mundo dirigentes à imagem e semelhança de sua loucura. São pessoas de inteligência mínima sem talento mas inchadas de vaidade que desprezam o trabalho aplicado no estudo, no conhecimento convencidos que o saber comum e ser "vivaço" é mais eficaz e suplanta todas as deficiências de inteligência. Tal falta de faculdades para racionalizar e formar juízos estruturados leva-o a cometer erros idiotas que depois o "vivaço" tenta disfarçar recorrendo a invenções e mentiras; apanhado a iludir é levado a inventar hipóteses cada vez mais fantasiosas e por fim acusa o outro como culpado dos seus falhanços e faz dele o bode expiatório do seu narcisismo que o leva a pensar que é único mas, jamais, que o é como idiota.

Tal tipo de pessoas que se julgam únicos, porque chegaram ao topo aplaudidos, pese embora, contestando a normalidade estabelecida com velhas ideias há muito abandonadas que representam um retrocesso de décadas da vida em comunidade, por que não são entendidos nem bem recebidos pelos homens inteligentes de conhecimentos, iniciam e enveredam por um caminhar conflituoso com a parte mais sã e competente da sua comunidade e tão teimosa e estupidamente alargam o conflito, quer no interior quer no exterior, que os fazem pensar que estão em guerra com o mundo e, nesse sentido, tornam-se pessoas altamente perigosas para a harmonia e paz sob o céu.

Mas, como no mito de Pandora, apesar de todos os males se terem soltado da caixa e fazerem-se à vida no mundo de maldades a Esperança manteve-se junto dos homens defendendo a tese de que uma vez que a Esperança nunca morre também nunca foge. Ainda hoje a Esperança mantém-se fiel ao seu princípio original e nos anima sempre perante toda a espécie de maldade; mesmo quando sentimos o mundo  abanar e o bem à beira do precipício: mesmo quando já perguntamos; - pode a idiotice vencer a inteligênca?- nunca desistimos de pensar que havendo mais inteligência no mundo que idiotice esta nunca vencerá. A favor deste pensamento está o facto de que todas as Instituições ou Entidades públicas ou privadas seleccionam e escolhem os mais competentes e essa condição é comummente reconhecida como pertencendo aos mais inteligentes; Qualquer trabalhador para ser recrutado é condição suficiente ser inteligente e não idiota. Ora, se assim é, num mundo cada vez mais dependente do conhecimento e do trabalho intelectual a selecção por via do posto de trabalho é favorável à inteligência; esta tornar-se-á cada vez mais maioritária e a idiotice mais reduzida e circunscrita pela inteligência vitoriosa.

Perguntar-se-á; e se os mais inteligentes se puserem ao serviço dos mais poderosos para formatar a maioria dos humanos em idiotas? Por mais "inteligência artificial" e "algoritmos" que possam impingir a muitos, bastará o sentido de evolução civilizacional, o pensamento lógico e a moralidade do senso comum para que os idiotas sejam sempre uma minoria; mesmo o considerado inteligente que se vende para integrar um tal programa de robotização humana porque julga possível tal realização, nem é inteligente mas sim mais um idiota a prazo; a Idade Média obscurantista durou séculos e foi para dezenas de gerações o imobilismo à semelhança do Deus imutável seu tutor, contudo, um dia chegou o Renascimento e de seguida o Século das Luzes.

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