sábado, janeiro 30, 2021

FALA TRISTE DA AMENDOEIRA ARGARVIA

A BICENTENÁRIA AMENDOEIRA NÃO DESISTE DE NOS MARAVILHAR

 

Fala triste da amendoeira algarvia:

Podem espreitar pelos vales e chapadas 

dos cerros do Barrocal e verão que ainda

existo. Não como antes existia,

em mantos contínuos de brancura avistadas

de qualquer lado do olhar a sempre linda

paisagem de amendoeiras juntas que floria 

e rendilhava o tapete verde de pinceladas

alvas, não vindas do céu, para recriar neve

a princesas nórdicas mas promessa de fruto 

nascido da terra para dar beleza e sustento

a quem gostava e tratava de mim, como deve,

como mereço, como se eu fora um produto

do amor dos homens como já fui e lamento

ser hoje seu desprezo; ruína sem tratamento.

 

Sim, fui o carinho delicado das gentes amigas

do campo que apreciavam em mim a beleza

da flor e o belo fruto do doce algarvio

inigualável. Fui isso e hoje fui dada às urtigas,

ao mato daninho que mata a minha natureza

de ser bela e boa ao mundo da vida, mata o cio

de minha semente e a torna irreprodutível

condenando-me a um holocausto lento.

E ninguém me ajuda, ninguém me dá a mão.

Estou condenada! Eu a óptima face à sofrível

concorrência sem sol e de doçura um intento.

Eu, a mancha maior de beleza e fruto de então

estou reduzida a salpicos à espera da terrível 

morte sem esperança levada no igual desalento

dos que gostaram e lutaram por mim em vão.

Vivo ainda da força de raízes próprias, apodrecidas,

que dão belas flores; falsa promessa de novas vidas.

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