quarta-feira, setembro 26, 2012

MEIO TERMO, CLASSE MÉDIA



"Importa manter que em tudo o que existe de contínuo e divisível há um excesso, um defeito e um meio-termo. Todavia, seja em que caso for, o termo médio relativamente a nós é o que há de melhor, pois isso é o que a ciência e a razão determinam. Com efeito, os contrários anulam-se mutuamente, e os extremos são contrários quer em relação a si próprios, quer em relação ao termo médio, visto que o termo médio é um outro extremo para cada um dos dois extremos; por exemplo o igual é mais do que menos e menos do que mais" 

Aristóteles in "Ética a Eudemo" Cap. 3


 Sociologicamente, qualquer leitor que acompanhe minimamente a história da filosofia desde os pré-socráticos até ao nosso tempo, constata facilmente que está na classe média o motor de arranque do conhecimento, do avanço da ciência, do desenvolvimento civilizacional e riqueza das nações tal como as conhecemos hoje. É a classe que, dada a independência económica individual de cada indivíduo, lhe dá um grau de liberdade intelectual e de acção que lhe permite questionar sempre o que está, como está, porque está como está e para que serve e a quem serve como está. Vide a vida e a morte de Sócrates a lutar intransigentemente pelas virtudes do bem e da justiça e procura da verdade assim como Giordano Bruno, Galileu e o nosso Padre Gusmão. 
Nesta classe social vão sempre desaguar e integrar-se os que, vindos de baixo, se libertam do circulo desqualificado de cultura e pobreza original para, pelas suas faculdades inatas de inteligência e trabalho acederem ao local social adequado ao desenvolvimento de seus recursos e faculdades de inteligência fértil. A ela também retornam, por via geracional, os melhores vindos de cima, que pela divisão hereditária da propriedade familiar retornam à classe donde haviam partido os avós. Aos piores de cima, normalmente pelos abusos e excessos de vida pródiga e viciosa a que se dedicaram, tornam-se decadentes e deixam de ser mais-valia civilizacional e, a maior parte, não querendo perder estatuto jogam mão de oportunismos vários indo engrossar as fileiras dos extremismos vingativos. 
A classe média é transversal a todas actividades profissionais e por tal é um factor ímpar de coesão e estabilidade social. Incluindo ela a fatia social mais culta e científica da sociedade, nela reside o grosso da racionalidade objectiva, do bom senso comum e moderação e muito pouco de aventureirismo e experimentalismo sociológico. 
O Empobrecimento e morte da classe média é um propósito ideológico de todos os totalitarismos, seja do capitalismo de Estado(socialismo real), seja do capitalismo proto-financeirista(plutocracia), ou outro qualquer modelo ditaturial puro ou disfarçado. Porque, por estratégia revolucionária, é preciso derrubar e desfazer essa forte barreira social esclarecida e coesa que liga e cimenta toda a sociedade tornando-a flexível mas resistente e intransigente face a experimentalismos sociais que sabe, desde os clássicos social-pitagorismo e filósofa-républica-platónica, até aos recentes nacional-socialismo e real-socialismo, são excessos que acabam sempre em tragédia sem qualquer ganho civilizacional, antes pelo contrário. 
 Ora, a esquerda(m-l)ou(m-t),como bons alunos da cartilha revolucionária, também lutam ambiciosa e consequentemente, com denodo e fúria, pelo poder total sem liberdade e, portanto, sem controlo democrático. E para tal estão dispostos a tudo para inviabilizar que a classe média cresça e se robusteça, pois que o seu crescimento e robustez corresponde-corresponderia, correlativamente, ao seu próprio definhamento. 
Dispostos mesmo a fazer as alianças mais espúrias dentro do espectro social existente, como fizeram no caso do PEC IV e, de certo modo surrateiramente, continuam fazendo sob uma fachada de protestação para militante ver. Veja-se o caso dos Professores e a oposição à fiscalização pelo TC do corte dos subsídios(contra inclusão de deputados seus para a fiscalização potestativa da lei). Afinal, acção essa que foi origem da nova proposta de lei com TSU, que por sua vez, foi origem do processo em curso de desmascaramento e desmoronamento do governo. Isto é, a acção em que a esquerda dura não quis participar foi mais eficiente que todas as operações de "massas" produzidas para catarse própria. 
É por isso que tal esquerda pura e dura tem um ódio de morte ao PS onde se integra com facilidade uma classe média esclarecida, capaz de aceitar mudanças de esquerda no quadro da liberdade, isto é, no quadro do civilizacionalmente possível, sem platónicas ou leninistas rupturas utópicas. 
Eles, todos que cercam pelos extremos o PS, sabem perfeitamente o que querem e trabalham sempre e acima de tudo para atingir o seu objectivo. Só quem geralmente não sabe bem qual o seu papel no meio da sociedade portuguesa é essa tal classe média que, amante da liberdade de expressão e opinião como motor da civilização, entalada entre extremos ideológicos, vacila.
Essa classe média que devia ler com atenção o que dizem os pensadores universais depois de muitos anos de matutar a cabeça sobre onde estava a virtude: "a moderação platónica" e “o meio termo” aristotélico.

Etiquetas: ,