quarta-feira, junho 27, 2007

PORTO,PRÓS E CONTRAS

O MOMENTO

Vindo de Lisboa ainda cheguei a tempo de ver parte do debate de ontem dos Prós e Contras para discutir o Porto pelos seus ditos altos representantes tidos como imagem do velho espírito nobre e liberal da invicta vontade nortenha de engrandecimento pelo trabalho e engenho. Mas quem lá estava eram os velhos negociantes iniciados e viciados na escola do salazarismo e como tal apenas sabem reivindicar a protecção do Estado para os seus crescentes negócios de comércio de trocas. Estava um senhor que me pareceu de visão mais recente e actualizada que falava nas ligações ao conhecimento para obter produtos de qualidade e sentia-se optimista com o seu pensamento e actuação. E estava um senhor jovem e activo que aparece todos os dias na televisão a falar de ciência de bola, de aeroportos, de TGVs, de política geral, de política partidária, de leis, comércio,etc., e ainda escreve crónicas nos jornais sobre qualquer assunto, tal o ecletismo e tempo de que dispõe, e parece que é dirigente de uma poderosa Associação Comercial dado a pujança que ostenta. Estava, como não podia deixar de ser, o Presidente da CM do Porto para alvo de todos, tentando responder aos mil problemas que o município tem para resolver sem verbas para tal, mas que todos sabem apontar do alto dos seus poleiros de papagaio.
E todos ficaram calados e mudos como um prego de cabeça chata, quando uma senhora representante dos comerciantes de rua da baixa portista acusou "as novas cidades(ou centralidades)" dos modernaços shopings que brotam à volta da cidade esvaziando-lhe a sua verdadeira centralidade histórica. Foi o momento buraco amnésico, entreolharam-se apavorados, emudeceram cabisbaixos como que sumindo-se num buraco ali aberto, e quando voltaram ao debate ignoraram o que tinham ouvido para tornar à vaca fria dos seus interesses, especialmente o senhor Belmiro que não escondia o seu ressabiamento contra o governo por não lhe conceder o chorudo negócio que tinha planeado sobre a PT. O grande momento do debate foi precisamente aquele que a senhora levantou com delicada leveza mas empunhando pedregulhos como Viriato. Quem não vê actualmente, em qualquer cidade do país onde florescem os shopings, o definhamento do comercio tradicional de ruas pedonais e centros de vilas e cidades despovoadas? Quem não vê as baixas de meter medo a quem se aventura andar nelas á noite?
Pior que a morte das baixas é a própria morte da vida da cidade. O pequeno comerciante era a alma da sua cidade; ele participava das tertúlias sobre as coisas da cidade, ele escrevia crónicas no semanário ou quinzenário local, ele criava o clube de bairro e era seu presidente ou entusiasta sincero, ele participava da banda local, do grupo de teatro amador, do cine cluble ou centro cultural local, discutia a política da cidade com entusiasmo, participava e enchia as bancadas dos clubes desportivos e recreativos, concorria às Juntas de Freguesia, etc., etc. Era um cidadão económicamente independente com hábitos de alguma leitura o que lhe conferia uma liberdade de crítica e opinião de grande validade para a comunidade dos cidadãos.
Será que os serviços que os actuais shopings proporcionam não poderiam ser instalados nas antigas e agradavelmente vistosas ruas, abertas ou toldadas, dos centros das cidades carregados de história e histórias, mantendo as imprescindíveis forças vivas da cidade activas pensando a construção da cidade como comunidade integrada de pessoas, casas de habitação, parques e jardins, comércio e cultura dirigida à inteligência e não ao consumismo primário. Os shopings priviligiam a construção de dormitórios que auto reproduzem os negócios do shoping e do imobiliário mutua e sucessivamente. A mentalidade shoping forma robots consumistas oficiosos praticantes inconscientes do ritual abandono e entrega da cidade à decadência cívica.
Provávelmente já não assistirei à futura revitalização da cidade para ver abrir teatros, galerias, exposições, museus, escolas de arte, etc., nos actuais recintos engalanados para ostentação e apelo imediato à cosmética prateleira de embalados, tal como hoje já se faz relativamente aos grandes e elegantes castelos, palácios e fábricas fechadas sem utilidade.

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