domingo, agosto 10, 2008

MARAFAÇÕES LXII


OS BASBAQUES
Pela leitura dos jornais de ontem, dia 9, após a cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim, constata-se que os nossos jornalistas limitaram-se a ser basbaques da grande encenação chinesa. A manchete do Público diz logo a abrir, " e ao primeiro dia a China seduziu o mundo" e depois na 2ª página nova parangona, "quatro horas em que o mundo pareceu quase perfeito" cujo texto continua nestes termos, " para viver, com uma cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos que os chineses transformaram numa demonstração de poder, riqueza civilizacional e diplomacia". E todo este comentário de Hugo Sousa sobre a abertura continua sempre neste embasbacado tom.
Para este basbaque, os chineses demonstraram, nesta abertura olímpica, tão somente poder, uma rica civilização e diplomacia. Num jornal onde tudo o que o nosso governo, legitimado por eleições livres e escrutinado por partidos e imprensa livres, anuncía ou faz é considerado propaganda, este embasbacado posto de olhos em bico, num país de regime ferozmente ditatorial com leis de trabalho e sociais semi-escravas, apenas vê riqueza, civilização e diplomacia.
Que esperava tal basbaque ver de uma potência ditaturial? Uma representação anárquica, com falhas de organização e dirigismo? Desconhece tal basbaque todas as grandes encenações de regimes ditaturiais de anteriores potências mundiais? Nunca viu, durante o prec pós-Abril, as impecáveis e grandiosas apologias da revolução maoista de óperas e teatro chineses que os nossos maoistas caseiros propagandeavam por cá? Até o facto de irem buscar um cineasta antigo opositor do regime, agora domesticado, para encenar e dirigir o espectáculo não foge ao estilo tradicional de mostrar a "abertura" dos regimes totalitários.
Certo é que os chineses, talvez devido à sua milenária e rica cultura, vão aqui colher os seus ideais de representação de elevado nacionalismo, mais ou menos disfarçado conforme as circunstâncias o requerem. Neste caso, os Jogos Olímpicos, a representação nacionalista de força e poder universal cada vez mais evidente face ao decadente Ocidente, obrigatóriamente, pelo simbolísmo de tempo de paz do evento nascido do génio grego antigo, não podia de modo algum ser belicista ou afrontoso, não deixando por isso de ser uma exibição de força e absolutismo.
Os manifestantes de ontem e de hoje na velha praça de Tiananmen ou do Tibete sabem bem como a força se exibe e faz sentir quando toca a reclamar pacíficamente vulgares liberdades políticas que não jogos de paz propiciadores de jogos de elevado cariz propagandístico. Contudo os nossos jornalistas e comentadores, sempre subservientes face ao "de fora" e estranho, perante o exotismo do estilo típico chinês de representação gestual, até as enormes e vulgares fumaradas coloridas e fogos de artifício os deixam enebriados como basbaques em extase.


O ORGULHO DO PACHECO
Mas a maior, mais descarada e miserável interpretação do espectáculo de abertura dos Jogos é do jornalista Pacheco, director adjunto do Público. Esta personagem das sombras tem a tremenda ideia de num editorial dedicado embevecidamente aos "chineses orgulhosos com o seu primeiro dia em que ganharam as atenções do mundo" com o "espectáculo que mais nenhum país estaria em condições de exibir" numa "exibição de mestria" na qual "a China volta a brilhar frente ao mundo" "num clima de segurança e desportivismo", juntar no mesmo editorial, em contraponto à laudatória da abertura dos jogos, a actuação da nossa polícia face aos assaltantes do BES em Lisboa, tratada de uma forma insidiosamente difamante. Enquanto na China tudo foi maravilha que "seduziu o mundo" na actuação da PSP tudo são dúvidas no pensamento doentio deste Pacheco. Na China aconteceram "coreografias de tirar o fôlego" mas em Lisboa " os reféns foram ameaçados, a sua vida corria perigo e era preciso escolher: eles ou os assaltamtes. Por isso a polícia matou. Por isso ou porque mais alguma coisa correu mal?" pergunta o desconfiado Pacheco. E esta fase do editorial contrapontista ao brilho chinês é, de uma ponta à outra, uma contínua interrogação insinuosa de que a actuação da polícia devia ter sido outra, que algo correu mal, e por isso morreu "uma pessoa com família, como nós".
É mais que evidente pela pachecal prosa, que caso tudo corresse ao contrário e o morto fosse um dos reféns, então a polícia que forçosamente teve de actuar, seria cozida em lume de letras incandescentes e editoriais de línguas de fogo vulcânicas saídas do inflamado pensamento canceroso deste portuguesinho Pacheco.

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