terça-feira, julho 31, 2007

GORJEIOS XV

TERRA DE EXÍLIO

Por aqui tudo sempre na mesma,
as horas são imitações das horas
os dias dos dias os anos dos anos,
os amanhâs futuros são manos
gémeos dos passados, as moras
de mudança perfazem uma resma
escrita e falada quase centenária,
aqui figueiras dão os mesmos figos,
alfarrobeiras as mesmas alfarrobas,
mentes bobas geram mentes bobas,
o mal dos novos já era dos antigos,
falas daqui não têm reunião camarária.
Por aqui tudo igual tudo velho,
líquidos sujos ou limpos não têm canudos
ligados às recomendações europeias,
estrada são vagas de ondas cheias
repetidas de buracos beiçudos
trinca-pneus acidentes avarias, espelho
rectrovisor do respeito que mandantes
votam a quem por amor suporta
cá viver e não no dormitório ou villa
empurrados por leis-quadro que destila
o exílio na terra ou venda dela e em pelota
vai ocupar os caixotes de imigrantes,
envolventes de shoppings e fóruns,
substitutos de hortas milherais maçarocas,
onde filhos e netos depois neste múnus
criados, gamelam fast-food e pipokas.

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sexta-feira, julho 27, 2007

MARAFAÇÕES XXIX

Paisagem Inóspita
Adão Contreiras















OS HOMENS SÃO SEMPRE SINCEROS. MUDAM DE SINCERIDADE NADA MAIS
.
Bernard Tristan(blog JBS)


SINCERIDADE I

Helena Roseta disse nos jornais que as pessoas de Cabeceiras de Basto em Lisboa na victória de A.Costa cheirava um pouco a Salazar.
Só é pena que o seu discurso anti-partidos também não lhe cheire a Salazar, não obstante ser muito mais salazarista e perigoso.



SINCERIDADE II

Saramago profetizou a inevitabilidade de mais tarde ou mais cedo Portugal se integrar na Espanha a que chama Ibéria. Como bom sara-mago que é sara esta ferida chamada Portugal com um passe de mágica à maneira marxista-leninista dos processos históricos inevitáveis: da miséria do capitalismo só pode nascer o comunismo, à pequenêz portuguesa só pode valer a grandeza ibérica. Claro, só na grande Ibéria cabe a grandeza de Saramago.
Saramago arrisca-se a ganhar futuramente, de certeza e distanciado, qualquer concurso sobre quem foi " O Maior Velho do Restelo de todos os tempos".

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quarta-feira, julho 18, 2007

MARAFAÇÕES XXV

OS INDEPENDENTES

Os independentes deram um sério aviso aos partidos nas eleições para Lisboa é a tónica geral dos comentaristas académicos. Roseta, que segundo declarou reuniu uma equipe de gente que um mês antes nem sequer conhecia a maior parte, gabou-se do tremendo aviso que ela constitui para os partidos. Carmona, por sua vez gabou-se do mesmo feito com uma velha equipa que conhecia de ginjeira e que os lisboetas deviam igualmente conhecer de ginjeira pelo trabalho empreendedor que os levou quase todos a serem arguidos por actos do seu poleiro.
Mas afinal estes independentes são independentes de quem? Dos partidos?Mas se sairam do ventre dos partidos para concorrerem às eleições como logo ficaram independentes das idéias, dos métodos, das tácticas e outros estratagemas partidárias? Por acaso fizeran um curso de desintoxicação rápida onde despegaram de si todo o saber aprendido em anos e anos de escola partidária e ficaram de repente limpos e purificados da mentalidade de aparelho que até aí foi sempre a sua?Um idependente tem mais e melhores idéias que um partidário? Sendo um ou um conjunto menor de pessoas a discutir um assunto encontra melhor solução para esse assunto? Uma formiga fora do formigueiro ou uma abelha fora da colmeia produz ou contribui mais e melhor para a sua comunidade?
Desde a sua invenção pelos Gregos que a democracia se fez e aperfeiçoou pelos partidos e o ataque à democracia se fez atacando a prtidirização e mau uso da governação pelos partidos. O pior é que com a queda dos partidos caiu a democracia que logo foi substituida por reis, tiranos, césares e déspotas enlouquecidos pelo poder. Em tempo e lado algum da História a queda da democracia trouxe outro tipo de governação melhor que ela. Os independentes para ganhar espaço político rápidamente se tornam fundamentalistas face aos partidos enquanto estes podem sem problemas incorporar os apartidários competentes. O discurso contra os partidos revela sempre o carácter de quem se julga e se quer acima dos partidos porque tem a soluçao na algibeira para tudo. E como não há milagres sem omnipotência se os deixarem à solta chegam lá.

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sexta-feira, julho 13, 2007

MARAFAÇÕES XXIX

POR MIM NUNCA

A perspicácia deste partido é tão má que o leva a propagandear um cartaz que nenhum regime autoritário ou mesmo ditatorial exitaria em patrocinar.
Estes dirigentes políticos não se propôem lutar pela liberdade de expressão própria de cada um e todos portugueses como cidadãos livres, não se comprometem lutar pelo meu direito a poder exprimir-me livremente pela minha boca. Nada disso, querem a liberdade de falar por mim, de falar em meu nome, para tanto basta que eles entendam que o governo me quer calar.
Mas exactamente isso é o sonho de todos os ditadores e a política de todos os totalitarismos; falar em nome dos outros sem consulta nem procuração para tal.

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quinta-feira, julho 12, 2007

MARAFAÇÕES XXVIII

PEPE, O METRALHADOR

No princípio foi apenas a linguagem guerreira dos relatadores que tranformavam os campos das disputas futebolísticas em campos de batalha. O avançado tal "metralha" o guarda-redes com "disparos e tiros fulminantes", o clube tal "tombou" após a "batalha" em campo, o avançado tal saiu "ferido" após a "guerra que travou" com o defesa tal, e outros mimos militares para descrever ilustradamente o jogo do pontapé na bola. Daqui foi um passo para os posteriores comentadores estudiosos das academias futebolísticas, juntarem à terminologia militar anterior, sofisticações como "disposição no terreno em W, em linha, em quadrado, em cunha", utilização de "estratégias de ataque e defesa", aplicação de "tácticas de penetração pelas alas", visão de jogo para abrir espaços livres onde aparece "o ponta de lança que fulmina a rede e mata o adversário", e outras subtilezas retiradas das novas maneiras limpas de guerrear.
Também desde a antiguidade se apelidou o campo de batalha como o "teatro de guerra". Ora se o jogo de bola é descrito e comentado como batalha, então também nele tenderá a haver, necessáriamente, o elemento de representação teatral. E se a batalha do pontapé na bola por via das multidões, televisões e milhões em jogo rápidamente se transformou em grande espectáculo de entretenimento universal, consequentemente teria de haver no interior desse universo circense o inevitável palco para representação, aclamação ou apupação dos jogadores-actores. Por via do gosto das multidões, cada vez mais, a "batalha" se vai transformando em "teatro" o qual, por sua vez, interpretando e descendo ao gosto mais rasteiro, incorpora todas as variantes conhecidas e desconhecidas da arte teatral. No "teatro" futebolístico coexiste e sobe ao palco conjuntamente a tragédia, a comédia, o drama, a sátira, o burlesco, o surrealismo, o erotismo, o bordalismo, o machismo, o populismo, o oportunismo, o burlanismo, o escapismo, etc., etc., e os psicanalistas sacariam da sebenta completa de Freud. Isto porque quando os actores entram em cena já os media escalpelizaram a vida pública, a privada e a íntima de cada actor, acentuaram ou amenizaram o carácter e interesses próprios de cada um, concorrendo deliberadamente para picar a clubite de cada espectador. Este interpreta e interpela o jogador-actor de acordo com os valores morais pré-concebidos e sua côr clubítica e não pela habilidade do jogador em si.
É tal a primazia do teatro sobre o jogo que muitos jogadores já são apelidados de "fiteiros", "peseteiros", e grande parte deles são precisamente acusados de "fazer teatro", "fintar o árbitro", "fazer ronha". Mas além da acção teatral visível, existe o lado invisível aos espectadores, mas audível e duramente sensível no palco, de tal forma que leva a reacções violentas entre actores. É a táctica do actor menor, quando encarregado de segurar outro maior que ele o não consegue, então usa a cuspidela na cara, a agressão dissimulada, a ofensa injuriosa pela palavra, espera a reacção do adversário e teatralmente finge-se o agredido. Topa-se muitas vezes que este tipo de actuação é uma estratégia usada tacitamente por forma a alterar a correlação de forças em campo por via das expulsões. O exemplo mais flagrante deu-se no último campeonato do mundo com a victória dos italianos por força da forçada expulsão do melhor jogador francês. As entediantes explicações éticas e morais dos comentadores destes comportamentos para desculpar o fundamento e causador do mal em detrimento da legítima defesa, dá cobertura a que cada vez mais esta cena teatral seja representada.
Vem tudo isto a propósito de Pepe que agora foi "vendido" por milhões. Também este actor do pomtapé na bola, ou no adversário, tinha a sua cena especial como actor no "teatro de guerra" do futebolismo: cada vez que "fuzilava" as redes adversárias corria com o seu fuzil-metralhadora na mão e disparava tiros para o ar num simulacro perfeito de anunciação de guerra. Por mim acho que devia ter sido mandado disparar tiros para outro lado há muito tempo.

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quarta-feira, julho 11, 2007

GORJEIOS XIV

A CIDADE BABÉLICA II

Fui ver finos vi finórios
fui ver brutos vi felizes
fui ver ricos vi pirosos
fui ver vivos vi velórios
fui ver parentes vi crises
fui ver donzelas vi esposos
fui ver jovens vi idosos
fui ver mulheres vi louraças
fui ver homens vi pulhices
fui ver doutos vi jericos
fui ver verdades vi trapaças
fui ver famosos vi misses
fui ver espertos vi xicos
fui ver viris vi papaslinhaças
fui ver amigos vi ameaças
fui ver cidades vi ruinas
fui ver campo vi lotes
fui ver mar vi turistas
fui ver rios vi sentinas
fui ver casas vi caixotes
fui ver Papa vi papistas
fui ver shopping vi meninas
fui ver cinema vi vaginas
fui ver sábios vi incerteza
fui ver política vi promessas
fui ver promessas vi crentes
fui ver liberdade vi-a presa
fui ver igualdade vi avessas
fui ver fraternidade vi dentes
fui ver propriedade vi avareza
fui ver Esperança vi-a ilesa.
Fui olhos do mundo sem juizo
vi grossas maldades pese-as
a necessidade e o ego. Preciso
foi recorrer ao cego Tirésias:
"só amas a ti próprio Narciso".

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segunda-feira, julho 09, 2007

GORJEIOS XIII

A CIDADE BABÉLICA

A verdade e liberdade tem tantas
falas quantas barrigas têm dores
na boca do estomago que leva azia
até à boca e língua pelas gargantas
pouco e mal usadas de sabores
nutritivos causa de choro e berraria
de esqueletos vivos e moscaria
rondando a verdade feita famélica
tanto como a verdade feita fartura
de quem tem tudo e sempre quer
mais construindo a cidade babélica
balbúrdia de saberes que murmura
alto a última verdade que sugere
direitos e liberdades sem rasura
nem limites numa aberta contenda
infindável de como ser livre e segura
uma verdade feita por encomenda.

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terça-feira, julho 03, 2007

MARAFAÇÕES XXVII

O CONTENTE-DESCONTENTE

É corrente, é fala comum, é conversa de café, é linguagem de livrescos, é mensagem à flôr da pele, é imitação de boca cheia, é resposta de ponta da língua, é a tradição passa culpas e desculpas nacional, é já uma mentalidade portuguesa elogiar os mortos e dizer mal dos vivos. Somos como vermes subterrâneos que detestam a luz e amam restos mortais. Todos os mortos da História são despidos de sua humanidade à época para serem cobertos com a capa de heróis nacionais sem mácula. A todos os mortos conhecidos, a nossa mentalidade coitadinho, mesmo para os maiores sacanas encontra um lado bom para elogiar e esquecer o resto. A todos os mortos desejávamos que estivessem vivos e a todos os vivos desejamos que morram amanhã. Somos implacáveis com os nossos conterrâneos vivos que se elevaram acima de nós e a quem desejamos a morte porque nos matam de inveja. Somos amáveis para com os mortos porque já não incomodam e ninguém inveja o seu estatuto de morto.
Tal como todos os malandros odeiam quem trabalha, assim todos os assentados contentes odeiam quem faz pela vida no emprego, na escola, na política, na ciência, nas artes, nas letras, quem na sua ocupação se dedica a escalar a montanha e atingir o alto. E o pior de todos é o contente por dentro, que sabe de si e por si que não contém capacidade para mais, e descontente por fora que, para esconder essa incapacidade própria, se manifesta ostensivamente de forma teatral barulhenta trágico-provocatória.
Na política, o uso e abuso pelo contente-descontente desta técnica é estratégia de vida corrente, porque não poucos logram atingir lugares imerecidos com alguma esperteza e muita dissimulação e, porque o caudal da vida política que leva muito lixo à tona, desagua no enorme estuário do Estado que não deixa ver o pormenor merdoso. O contente-descontente que não alcança objectivos perseguidos leva a vida proferindo imprecações de morte face aos políticos governantes vivos e, ao mesmo tempo, implícita ou subentidamente, solicita o regresso à cadeira do poder do ditador morto caído da cadeira do lazer. Para estes, os políticos vivos são sempre uns bandidos que roubam, se enchem e vivem à custa do seu dinheiro e do seu trabalho, ao contrário dos políticos mortos que, embora ocupando os mesmos palácios e mordomias do Estado, viviam do seu honesto trabalho. Há ainda o contente-descontente incontido, que quer ascender rápidamente e a qualquer preço ao lugar dos outros ou entre os outros, os tais contra quem profere imprecações de morte, e que envereda pela provocação na tentativa de por esse meio saltar para a actualidade falada e escrita, e de seguida, com sorte e habilidade, saltar para o almejado poleiro.
Contudo o contente-descontente ufana-se em declarar em todas as mesas: "...eu não sujo as mãos na merda da política", e proclama-se independente mas sempre pronto a apoiar e participar em movimentos cívico-políticos de outros contentes-descontentes mais notáveis. Ele só apoia causas nobres fora do sistema, é o puro contra o sistema corrupto, não vota na política possível nem nos políticos existentes, bate-se pela sua própria política na roda de amigos, é justiceiro de má língua por conta própria, não vai a eleições nem faz campanha poque não quer enganar ninguém, não quer fazer promessas que depois os outros não o deixem cumprir. No fundo o contente-descontente paira por sobre o povo intelectualmente, presume que o povo se deixa enganar e devia apelar a si para o salvar e, jamais obrigá-lo a suportar o mal cheiroso povo das feiras, das praças, das ruas dos bairros sociais, dos arraiais populares, dos comícios, dos lares de idosos e refeitórios de mendigos, etc. Com tal mentalidade, se um dia obtivesse o poder relegaria imediatamente esse povo ignorante e suas atrazadas tradições, para cobaia das utopias que lhe povoam a cabeça a partir dos sistemas político-filosóficos da moda.
Os contentes-descontentes surgem à frente de comissões ou associações de amigos de protestos, andam pelo ensino, abundam no jornalismo, mas basta uma olhadela alargada pela blogosfera para constatarmos que esta se transformou no verdadeiro mato onde se alberga toda a bicharada da estirpe contente-descontente.

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