quinta-feira, maio 31, 2007

LISBOAS

LISBOA I

Através da poetisa amiga Eduarda Chiote, mãe de Joaquim Pinto, fui convidado pela Cinemateca Portuguesa-Museu do Cinema e FILMEBASE para a ante-estreia dos filmes de Joaquim Pinto e Nuno Leonel:

.SOL MENOR / 2007, 7 minutos.
.SEGURANÇA MARÍTIMA, PASSADO PRESENTE E FUTURO/2005, 28 minutos.
.ENTREVISTA COM YVONNE BEZERRA DE MELO/2004, 33minutos.
.PORCA MISÉRIA/ 2007, 4 minutos.

O filme SOL MENOR trata de imagens captadas inorgânicamente pela ilha de Santa Maria dos Açores num período em que a actividade e radiação do sol é menor. São imagens da natureza ou da actividade humana característica da Ilha, que no caso captadas por mão de cineastas experientes e estéticamente exigentes, acabam por nos maravilhar pela beleza e pelo significado.

O filme SEGURANÇA MARÍTIMA, PASSADO, PRESENTE E FUTURO, é um novo documentário sobre as questões da pesca nos Açores, que vem na sequência de outro, "Rabo de Peixe" de 2006. Este tratava da faina da pesca ao vivo, com os próprios pescadores envolvidos no recolher das redes em pleno mar das ilhas altamente encrespado e os perigos decorrentes dessa situação, que a câmara capta de tal modo que nos faz sentir dentro do barco. Tendo conhecimento deste primeiro filme a Associação Marítima Açoriana convidou os realizadores a fazer este filme de recorte didáctico para a formação na área da segurança no mar. Embora sendo seu objecto principal ligar a noção de formação ao quotidiano da pesca, os responsáveis pelo filme, como homens do cinema a sério, não se deixaram cair no facilitismo ou amadorismo. Filmaram as situações de exemplo formativo com criatividade fílmica e de montagem de modo que a beleza e ritmo do filme se imponha arrastando consigo o didactismo pretendido.

O filme ENTREVISTA COM YVONNE BEZERRA DE MELO, trata do problema social que se tornou mundialmente conhecido como os "Meninos de Rua" do Rio de Janeiro. Yvonne é uma artista plástica que viveu muitos anos na Europa e ao voltar para o Brazil, chocada com a situação de violência sobre as criânças de rua, assumiu sozinha o combate e defesa dessas criânças. Foi responsável pela denúncia internacional do massacre da igreja da Candelária e pelo processo instaurado às forças policiais intervenientes. A entrevista relata de forma serena o dia a dia dos meninos que vivem debaixo dos viadutos nos subúrbios do Rio e mendigam aos automobilistas nos semáforos, e como ainda criânças já têm marcas evidentes de mazelas da droga e da prostituição a que são submetidos pelos traficantes mais velhos. Diz Yvonne, que um dia, a experiência adquirida fará dos miúdos de hoje os mais velhos de amanhã e as relações de poder entre eles perpetuam um ciclo infernal do qual poucos escapam. O seu trabalho e aposta diária é exactamente ajudar o maior número possível a libertar-se desse ciclo miserável de vida curta.

O filme PORCA MISÉRIA, é um pequeno filme de animação, feito tradicionalmente, sem recurso a meios computorizados, sem por isso deixar de nos sensibilizar, ou talvez por isso, pela emgenhosa e imaginativa ilustração do porquinho de porcelana feito sem amor para ser mealheiro duma família abastada que igualmente o tratava sem consideração. Decadente e abandonado foi parar a casa de pessoas pobres que o amavam tanto como às poucas moedas de que dispunham para lhe pôr dentro. Com o amor dos donos pobres ele sentiu-se mais rico de bem estar consigo próprio.


LISBOA II

Depois de assistir aos filmes acima descritos e, depois de uma saltada a Nisa para uma reunião de confraternização, em casa do meu colega de guerra, furriel Chambel, que juntou vários comandantes de pelotão e secção da nossa Unidade à volta duma mesa isenta de "ração de combate" e farta de apetitosa "refeição quente", no bonito páteo vestido de canteiros de flores, onde apenas o mau tempo nos ameaçava, mas não metia medo e até parecia tempo de praia a quem viveu debaixo de fogo tantos momentos e estava ali para recordar esses tempos de perigos comuns, cimento duma amizade à prova de bala que se mantem há quase meio século, voltei a Lisboa para visitar a 77ª feira do livro em cuso.
Visitei a feira segunda-feira para uma observação geral e adquirir alguns livros que sobraram da lista do ano passado e na terça-feira para ir buscar os mais cobiçados durante a obsevação do dia anterior. Vim carregado, agora resta arranjar tempo para a leitura ou acabar por os colocar na estante sem esquecer pois, quem sabe um dia não terei de ler à pressa para me documentar para um post, já que a ciência de computador não é muito fiável.

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quinta-feira, maio 24, 2007

NOTÍCIAS DO PAU VII

DE OVÍDIO A VIRGÍLIO

Qual a duração de um costume antigo, de um provérbio popular, de uma tradição oral, de uma oração milagrosa, da crença num feitiço ou nos efeitos de artes mágicas? Séculos, milénios?
Há dias tinha lido em um dos seus poemas do livro "Amores" de Ovídio, uma referência às artes mágicas de Circe, assim: "... ela conhece bem o poder das ervas, o poder dos líquidos segregados pela égua em tempo de cio".
Agora calculem qual o meu espanto quando, dias depois, fui até ao jornal do pau, aqui nos Gorjões, e no meio da conversa, o Virgílio "Furgena", quando lhe perguntaram se não queria feno para dar às cabras que ele tinha em casa e guardava pelo campo, respondeu: "...quais cabras, só tenho uma e não sei se ela escapa, já morreram duas e tenho outra a morrer em casa. Fui com elas para um nateiro junto ao mato, comeram erva mijada por ouriça prenha ficaram logo doentes, não há salvação".
Que dizer desta similitude evidente entre estas duas opiniões com dois milénios de interválo entre elas? E como se ligaram através dos tempos a opínião de um dos homens mais cultos da época augusta romana com a opinião de um homem actual quase analfabeto? O poder curativo das ervas já era conhecido desde os muito antigos e o conhecimento das doenças através da urina foi teorizado por Hipócrates, mas a idéia dos malefícios da erva molhada de urina de animais em determinado estado sexual, só tem sentido na crença em feitiços e artes mágicas mitológicas.
Ovídio e Virgílo "Furgena", o poeta e o pastor, juntos invocando o mesmo desgosto; um por amor de Corina o outro por amor das cabras.

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segunda-feira, maio 21, 2007

MARAFAÇÕES XXIII


A LONGA ILITERACIA

Já era voz corrente dos historiadores que o nosso primeiro rei, fraco general mas astuto e valente guerrilheiro, não sabia ler e escrever, o que José Mattoso confirma em entrvista ao "Público" de sexta-feira. Como muitos reis e princípes da época, era analbabeto, o que se julga ter acontecido com os nossos primeiros reis até D. Dinis. Estava-se ainda em plena e madura Idade Média e toda a ciência estava encerrada nos conventos e a literacia no clero o que lhe dava o poderoso poder do conhecimento aliado do poder superior fundamentado no transcendente religioso. Isso fazia do clero, já fortemente enriquecido pelas heranças e legados dos crentes, e pela vassalagem real ao papado desde Zamora(mais as quatro onças de ouro anuais), a força mais influente e determinante na condução da coisas do principado e depois do reino.
Contudo a um homem ambicioso, valente e observador atento dos homens e da situação favorável existente no seu tempo, a ignorância histórica aguça-lhe a esperteza, a perfídia e a determinação da independência. Nem brios cavaleirescos, nem sentimentos familiares, nem heroicidades homéricas ou grandezas poéticas suas desconhecidas, enchiam a sua cabeça estreita e inteiramente ocupada na idéia de independência. Rasgando tratados e sem palavra, com alguma fortuna mas sobretudo com muita audácia e coragem conseguiu o seu objectivo e como diz Oliveira Martins:
"...se entre os herdeiros de uma história comum, há o amor por essa pátria e a veneração pelos antepassados, nenhum merece na alma dos portugueses respeito maior do que o primeiro de todos aqueles a cujo braço esforçado se deve a obra da contituição política da nação. Neste sentido as manias chegam a ser sublimes. Um salteador é, não raro, um verdadeiro herói; a perfídia é uma virtude, a crueldade é um titulo de glória, porque o espírito colectivo substitui o critério moral e abstrato pelo critério histórico, o qual tem como base a consagração dos factos consumados.
A separação de Portugal foi um facto consumado, graças ao valente, medíocre, tenaz, brutal e pérfido carácter de Afonso Henriques."

A nacionalidade e desde então o nascimento de uma identidade portuguesa tem na sua fundação um rei que conseguiu totalmente os seus objectivos sem necessidade de saber ler, escrever ou contar, mas tão só actuando prosaica e pragmaticamente apenas com a sua coragem, astúcia e perfídia perante a família ibérica da altura. Talvez a nossa maior marca identitária esteja nesta matriz original baseada na esperteza ambiciosa e na coragem mediocre, que por artes e manhas vai obtendo os fins que deseja alcançar. E se se consegue sempre safar e sobreviver sem precisar usar de literacia para que raio quer saber de números, contas e leituras? Que é isso de conhecimentos, para que serve, como e onde se aplica essa sabedoria na conta corrente da luta do dia a dia? O desenrrascanso e a improvisação já considerados como feitos da nossa maneira de ser não são o retrato e a marca de origem do desenrrascado Afonso? A tão cantada e própria saudade portuguesa, aquela "...que sempre nos está fazendo interiormente de que, fóra de nós, há outra cousa melhor que nós mesmos com que nos desejamos unir", não é um sentimento de recurso da ignorância que encobre a nossa atávica iliteracia?
Evidentemente que sem aprofundada apreensão de todo o conhecimento passado e presente jamais um povo tem capacidade de inscrever cientificamente o que quer que seja na história. Poderá inscrever uma gesta épica baseada numa actitude aventuresca corajosa e tendo como móbil o pérfido enriquecimento pela rapinagem, ou seja um bem para vencedores que acarreta um mal a vencidos e jamais um bem para a humanidade sem ser contra outrem. Até a victoriosa gesta dos Descobrimentos que nos inscreve na história universal, ainda hoje se discute e não se sabe com certeza se foi um acto pensado, estudado e preparado à luz dos mais actualizados conhecimentos da altura na matéria ou uma sucessão de experiências inicialmente um tanto lançadas ao acaso. A longa ileteracia que acompanha o nosso já longo passado, apesar da épica marítima e também consequência dela, ilustra bem o vazio do nosso contributo para o conhecimento actual da humanidade.
E pensarmos nós que 1500 anos antes já, na primitiva democracia grega, seria impensável alguem alcandorar-se ao topo do poder sem ser instruido do mais elevado conhecimento existente à época. Estes reuniram e discutiram criticamente todo o elevado saber dos povos mais civilizados da altura, formaram escolas de estudo, ensino e difusão, racionalizaram o conhecimento existente, deduziram racional e lógicamente novos conhecimentos, tornaram-se sábios e inventores e inscreveram inapagavelmente a fundamentação da nossa civilização ocidental. Também eles tiveram um poderoso império territorial que como todos ruiu estrondosamente, contudo o seu império cultural tornou-se objecto de culto de toda a humanidade, imortalizou-se.

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domingo, maio 20, 2007

MARAFAÇÕES XXII

MARCELISMOS

Marcelo, o grande parecereiro e crítico literário semanal de capas de livros, continua com a sua isenta imaginação na ponta da língua. Ainda há pouco no seu habitual oráculo televisivo, com a sua pitonisíaca seriedade e isenção, tirou da obscuridade e desvendou os indecifráveis seguintes misteriosos pontos de vista:

1.- Belmiro de Azevedo está atento às manobras na PT Multimédia.
E nós a pensarmos que Belmiro está em cima do Executivo e manobra forte desde que perdeu a opa a julgar pelo que vemos e lemos todos os dias, pela mão do seu cipaio, no jornal "Publico".

2.- A saída de Rui Pereira do Tribunal Constitucional é desprestigiante para o Tribunal e não acrescenta nada ao governo.
E nós lembrados que quando Durão largou o governo da nação a fugir, e deixou Santana Lopes, era um elevado mérito para o país e um robusto contributo para a grandeza de UE.

Marcelo, afilhado de Marcelo, quiçá para um dia o substituir no Conselho de Ministros, acabou memo por o substituir nas "Conversas em Família".

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sábado, maio 19, 2007

NOTÍCIAS DO PAU VI



















CINE CLUBE DE FARO 50 ANOS

Para o encerramento das comemorações do 50º aniversário do Cine Clube de Faro a direcção promoveu e brindou os seus associados com um condigno programa em três andamentos. Primeiro com a exibição do amoroso e comovente filme "Don Roberto" de 1962 realizado por Ernesto de Sousa sem subsídios. Segundo com a estreia absoluta da "Suite para Don Roberto" de Bernardo Sassetti, idealizada e composta a partir das impressões musicais que o visionamento sucessivo do dito filme lhe registaram na alma.
Em muito boa hora o Cine Clube nos deu estes três momentos especiais de elevado nível, com o filme que nos transporta à nossa infância quando, nas feiras e festas rurais, ficávamos horas de boca aberta e olhos arregalados a beber as tropelias dos bonecos de pau dos teatrinhos ambulantes de "Robertos". Aqui, nos Gorjões, no dia da festa grande da Sociedade Recreativa aparecia sempre o homem dos Robertos e era a atracção e alegria maior da mocinhada.
Não indo além de ouvinte de pouco ouvido para a música entendi, da Suite para Don Roberto, que se integra completamente na mais moderna sonoridade actual com o condão de ser interpretada e executada por três músicos, Bernardo Sassetti piano, Carlos Barreto contrabaixo, Alexandre Frazão bateria, mesmo bons em qualquer parte do mundo. O andamento mais vivo inspirado nas disputas pauliteiras dos Robertos achei-o brilhante e proporcionou solos magníficos, sobretudo o solo de baixo foi inapagável.
Para rematar ainda tivemos direito a uma agradável e belíssima surpresa no átrio do magnífico Teatro das Figuras. Tratou-se, à saida, de uma representação ao vivo de uma pequena peça de Robertos "O Barbeiro Desconjuntado" desempenhado por um preservador e estudioso desta tão rica arte popular. No final os miúdos presentes estavam extasiados defronte da tenda-teatrinho de um dos últimos resistentes Don Roberto ainda activo. Naquele momento os pequenos ficaram maiores e os grandes volveram pequenos.

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terça-feira, maio 15, 2007

NOTÍCIAS DO PAU V


IIL CURSO DE ELECTROTÉCNIA E MÁQUINAS 1963-1967

O curso do Instituto Industrial de Lisboa de Electrotécnia e Máquinas de 1963-1967, iniciou no dia 12 as comemorações do seu 40º aniversário com uma reunião de confraternização no Alentejo. Um autocarro completo vindo de Lisboa e outros em viatura própria encontraram-se junto à porta central do Castelo de Vila Viçosa para uma visita ao Museu da Caça e das Armas sito no interior do Castelo, antigo Paço Ducal. Após esta visita ao magnífico conteúdo e espaço do museu, pouco conhecido mas digno de uma visita com olhar atento, a caravana dirigiu-se para o Hotel Rural Valmonte, em Borba, no interior duma quinta de vinhas e pomares, onde estava marcado o almoço para celebrar "à saúde da malta do IIL" com vinho de produção local e "cantar os parabens" com bolo e champanhe.



DO GRUPO DOS SEMPRE PRESENTES SÃO ESTES OS ORGANIZADORES




A história desta reúnião seria banal caso tivesse sido convocada apenas sob o pretexto de festejar agora o 40º aniversário da conclusão do Curso de Electrotécnia e Máquinas do IIL. Contudo a história deste Curso é uma longa narrativa com episódios certos de 6 em 6 meses a partir de Novembro de 1967. Atravessou o salazarismo, o marcelismo, Abril revolucionário, o prec, o democraticismo, 7 presidentes da Répública, dezenas de governos, estados de crise e de bonança e continua. Já atravessou a morte de muitos colegas do casarão da Buenos Aires e mantem-se de pé.














Desde Novembro de 1967, data da 1ª confraternização, ficou estabelecido que iriamos comemorar o Curso todos os seis meses e assim tem sido sem uma única falha ao longo de 40 anos. Também outra deliberação tomada desde o início tem sido mantida sem mudança, apesar de algumas tentativas de subverter o espírito do convívio, que é o facto das confraternizações serem mesmo "De Curso" e não de tipo familiar. Assim, semestralmente, reúnem-se sem acompanhantes, apenas os finalistas. E como em 1967 ainda não havia mulheres em Electrotécnia e Máquinas, as confraternizações estão apenas reservadas a homens.









Quarenta anos duas vezes ao ano
subimos o palco e abrimos o pano
do teatro de sonhos mortos
que a luta diária mano a mano
levou uns atrás dos outros
ao tapete e todos os nossos mares
de sonhos tombaram dos ares
ao chão às cambalhotas
sem pára-quedas, são cadáveres
podres em tempo de arrumar botas.

Valhem-nos as memórias deles,
as lutas que travámos, as peles
que trocámos, as mãos postas
no fogo, as submissões reles
que suportámos, o curvar costas,
as máscaras na cara sem vergonha,
e tudo porque um homen sonha
sempre, tropeça e se alevanta,
brinda à amizade, e um dia a ronha
negra nos invade de eterna noite santa.

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segunda-feira, maio 14, 2007

NOTÍCIAS DO PAU IV







EXPOSIÇÃO DE ADÃO CONTREIRAS

No dia 11 o pintor gorjonense Adão Contreiras inaugurou na Galeria Margem em Faro uma exposição de pintura com base nos seus últimos trabalhos. Umas dezenas de pequenos quadros impressos de percepções activas do autor, concebidos num contínuo pictural à maneira de banda desenhada impressionista em conjuntos de variações do mesmo tema até à gradual transição para novo tema e novas variações. A obra feita de retalhos soltos interligados picturalmente permite tantas organizações conjuntorais quanto a imaginação individual de cada observador. A organização exposta pelo pintor tem uma sequência práticamente cronológica indiciadora de um trabalho, embora executado ao longo do tempo, pensado e estruturado segundo o pensamento do autor e suas percepções materializadas impressivamente. À primeira vista ressalta alguma estranheza pela fragmentação de telas cores e temas mas após uma segunda e terceira observação atenta uma beleza subtil sobressai e impregna a nossa memória.

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quinta-feira, maio 10, 2007

GUERRA COLONIAL


CAPA DO LIVRO
"ESQUADRÃO 149 A GUERRA E OS DIAS"

DE JOSÉ NEVES






ASPECTOS DA TOMADA DE NAMBUANGONGO

Segundo Tito Lívio, após a victória de Canas, Maárbal comandante da cavalaria, voltou-se para Aníbal e disse-lhe: "É indispensável que tires deste triunfo todas as consequências, que dele devem decorrer. Dentro de poucos dias deves jantar no Capitólio. Entendo que deves seguir quanto antes, eu te precederei com a cavalaria, de sorte que os Romanos venham a saber da minha chegada, antes de terem tido notícia da minha partida".
Aníbal recusou invocando tempo para meditar e reflectir acerca da marcha sobre Roma.
Maárbal retorquiu: "Sabes vencer, Aníbal, mas não sabes aproveitar-te da victória".

Em Julho-Agosto de 1961, em Angola, dos três Comandantes de forças militares empenhadas na tomada de Nambuangongo, apenas um teve a visão do general Maárbal e por coincidência também era o Comandante da coluna de cavalaria, o Esquadrão 149. Ainda antes da grande arrancada do Esquadrão do Ambriz, foi enviado, em exploração do terreno, um pelotão que foi atacado no Cavunga a 53 kms e regressou de noite, temeroso e aflito, com alguns feridos ligeiros. Imediatamente o Comandante, perante a perplexidade dos oficiais, deu ordem para o mesmo pelotão se preparar e avançar de novo para explorar a victória do Cavunga sem dar tempo à recomposição defensiva do inimigo. Este episódio deu discussão acesa entre Comandante e Alferes que atrazou o arranque definitivo do Esquadrão e foi motivo de duradoura discórdia entre ambos, embora o Alferes reconheça hoje a razão e justeza militar do sacrifício pedido, face ao sinal que tal acto arrojado representava quer para o inimigo quer para o interior da Unidade. Hoje o Alferes pode orgulhar-se de ter sido o primeiro a passar as portas da guerra, com feridos mas com sucesso e homens receosos mas confiantes combatentes já iniciados no fogo de combate.
Já houvera precedentes mas este foi o sinal claro da estratégia geral que estava na cabeça do Comandante e um aviso inequívoco de actuação futura dado a todos os oficiais, sargentos e praças sob seu comando. A surpresa era a táctica diária, explorar em força cada victória era a estratégia geral até ao objectivo final. Em Quimbunbe, após um segundo acampamento e analizada a actuação, forças e armamento do inimigo, o Comandante decide avançar de noite e dia sem parar, exactamente no sentido de chegar junto do inimigo antes que este soubesse da sua partida. E sobretudo estar sempre pronto a carregar sobre o inimigo e fazê-lo recuar mesmo que este infligisse feridos e mortos como aconteceu na batalha de Zala. Com tal rapidez e força de pressão contínua não foi possível ao inimigo colocar mais abatizes e alçapões na picada e de noite tornou-se inofensivo.
Constatado o sucesso prático do uso da estratégia definida , após um dia em Zala para hastear bandeira, com parada a rigor de Soldados sujos e sorridentes, rotos e ratos de guerra, no Posto Administrativo local, o Comandante quer impôr a marcha imediata para Nambuangongo, mas aqui a vóz dos subalternos foi mais forte devido aos feridos, à fadiga geral e sobretudo à falta de munições. O Comandante pensou arrancar com as condições existentes e uma força menor desde que pudesse contar com o pelotão adido de blindados ligeiros, mas este não aderiu e o Esquadrão ficou em Zala outro dia para ser reabastecido por via aérea através duma pista de terra capinada no momento. Na arrancada final de Zala para Nambuangongo manteve a mesma determinação de fazer a caminhada de noite e dia sem parar e foi confirmado o facto de que o inimigo estava impotente e sentia-se batido pois limitou-se a observar de longe a progressão sem intervir.
O Esquadrão 149 não foi o primeiro a jantar em Nambuangongo, tomou o pequeno almoço depois do jantar do Batalhão 96, mas também esta Unidade havia iniciado a operação dias antes e desobstruira um percurso mais curto. E foi notório e sentido pela tropa das duas Unidades em marcha sobre o objectivo final, que o Estado Maior da Operação Viriato se serviu da actuação fulgurante do Esquadrão 149, estimulando a competetividade para ser primeiro e obter os louros da conquista, as tropas mais próximas e assim atingir em tempo útil o objectivo militar que correspondia ao objectivo político da altura.

Por natureza própria ou por conhecimento e estudo, o Comandante Capitão Rui Abrantes, professor de táctica na Academia Militar, demonstrou na prática ter as qualidades e visão estratégica do grande Maárbal, pela lucidez em analizar as potencialidades próprias e do inimigo, pela argúcia, sagueza e capacidade estratégica, pelo comportamento exemplar na frente de combate, pelo respeito militar e humano quer frente aos seus homens quer perante o adversário, desde o primeiro dia conquistou a disposição e entrega total dos seus Soldados face a qualquer situação. E todos confiaram e corresponderam tão pronto, decidida e abnegadamente sob constante perigo de vida, que os regressados ilesos se sentem heróis vivos resgatados da companhia dos heróis feridos e mortos em combate, pela conduta, coragem e moral impostos, desde a primeira hora pelo comando do Esquadrão.

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quarta-feira, maio 09, 2007

MARAFAÇÕES XXI


PRODUTIVIDADE

No "Público" de anteontem do passado dia 7, pode ler-se na pág. 42, a grande lição de macro-economia individul de como em tempo de badalado necessário aperto de cinto para todos, alguns estoiraram com ele e já não lhes cabem as barrigas no belo arco da rua Augusta quanto mais no pequeno inestético e incómodo cinto. Reza assim a notícia: "Cada comissão executiva das empresas cotadas na Bolsa de Lisboa ganhou, em média, 3,5 milhoes de euros em 2005, mais do dobro do que auferia em média no ano 2000.Olhando apenas para as empresas do PSI20, índice que agrupa as maiores sociedades cotadas no mercado portugês, o aumento é superior a 3,2 vezes"
Em todas as discussões salariais anuais se exige que os aumentos sejam de acordo com a produtividade do país, logo daqui se tiram as seguintes conclusões:

1. - Que a estes senhores gestores não se aplica a lei obrigatória aos restantes trabalhadores, ou,
2. - Que nas empresas destes senhores a produtividade é 3,2 vezes a do resto do país, ou,
3.- Que estes senhores não são deste país.

Como a notícia se refere a empresas cotadas na Bolsa de Lisboa, supõe-se que muitos serão portugueses. Então propõe-se que se ponham estes senhores a trabalhar junto dos portugueses normais para fazer a produtividade subir em flecha e todos beneficiarem de altos salários. Ao menos uma vez na vida sejam amigos e não olhem apenas para a vossa barriga.

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segunda-feira, maio 07, 2007

GORJEIOS X














MESTRES DOS GORJÕES

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Os Mestres citados, atrás lidos,
os Mestres Desconhecidos,
construtores de sonhos e peças
únicas, hojes, amanhãs e fins,
foram educadores, almas, clarins,
contra um mundo indo às avessas.

Foram Mestres de ofícios, de mãos,
foram Mestres de sonhos, artesãos,
foram Mestres de luta, utópicos,
foram Mestres de lisura, limpos,
foram Mestres de exemplo, distintos,
foram Mestres do seu tempo, únicos.


Do livro "GORJEIOS" de José Neves

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domingo, maio 06, 2007

NOTÍCIAS DO PAU III


OS PARADOXOS DE ALBERTO E RANGEL

Sensibilidades de ilhéu?

Fidel vê em cada americano um imperador, Alberto João vê em cada cont'nental um colonizador.

O Dr. Alberto chama cubanos aos cont'nentais mas é o povo da Madeira que vota como os cubanos, elege o Dr. Alberto com percentagens à cubana e o mantem no poder tempo à cubana.

O Dr. Rangel sonha para o continente com liberdades à madeirense para volltar a sentir-se e respirar desclaustrofobizado.

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sexta-feira, maio 04, 2007

MARAFAÇÕES XX

LISBOETAS

Estão os jornalistas, eles próprios, em nome dos lisboetas e certamente todo lisboeta do país inteiro, muito inquietos pela situação a que chegou a autarquia de Lisboa.
Afinal os jornalistas e os lisboetas queixam-se de Carmona. Por mistificação política empurram a culpa para outro só que esse outro foi o eleito por eles próprios. É a si que devem culpar-se, pois foi pelas vossas próprias mãos que meteram o voto e o Carmona na urna.
Mas a desgraça de Lisboa não nasceu com Carmona, mas sim quando os politicamente adiantados lisboetas puseram à frente da autarquia o inenarrável Santana. Sob que leviano entendimento viram a sua conduta na longínqua Figueira da Foz? E na direcção do Sporting, nas barbas dos escolarizados lisboetas, ninguém se apercebeu porque o Roquete o tirou de lá ao fim de seis meses? Nem ninguém ligou e soube interpretar porque ruiu tão desastrosamente o pequeno império de media portuguesa que chegou a ter?
Tudo acabou na desordem financeira e no governo o descalabro estava em marcha. Os seus discípulos têm a sua escola, dificilmente podiam fazer melhor. Depois disto tudo os lisboetas escolheram o santanismo para chefiar a autarquia: queixem-se de vós próprios, façam mea-culpa e prá próxima pensem duas vezes antes de votar.

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quarta-feira, maio 02, 2007

MARAFAÇÕES XIX

A CULTURA E O PODER, A RENÚNCIA COMO PODER

No blog amigo BRACIAIS foi colocado o problema da "Cultura e o Poder" a partir dum texto de Sofia de Melo Breymer Andersen, e também o problema da "Renúncia como Poder" a partir duma citação de Fernando Pessoa. Também noutra ocasião o Braciais falara da boémia de Baudelair. Ao desafio de comentar tais assertações respondi como segue:

Karl Popper diz que cultura é tudo aquilo que é produzido pela mão do homem. Num conceito geral de actualidade assim será mas penso que Cultura é apenas o que, após a prova do tempo, históricamente, sobressai da fabricação cultural popperiana, se torna imortal e adoptada como identidade dum povo, como diz SMBA. A Cultura não tem de ser necessariamente anti-poder mas tende a ser contra-poder na medida em que precisa ser subversiva do poder estabelecido dominante. O trabalho da Cultura é denunciar e subverter costumes e estéticas definidas e defendidas oportunisticamente, em cada actualidade, pelos que dela beneficiam. A Cultura que não morre é aquela que derruba cânones, que com base em novas maneiras de ver e encarar o futuro, a partir da realidade existente, propõe uma visão diferente em sintonia com as novas realidades emergentes. Para isso o Homem de Cultura tem de ser alheio a poderes dirigistas e actuar em conformidade com as novas realidades circundantes que lhe despertaram um pensar diferente do homem comum. Contudo o Homem tem uma existência no tempo e não pode ser indiferente aos acontecimentos que o rodeiam e que o podem entusiasmar exaltadamente. As Odes de Píndaro cantam os vencedores olímpicos, o Parténon representava as origens e história da grandeza grega, a Eneida canta os feitos originais da grandeza romana, tal como os Lusíadas relativamente a Portugal. O acto cultural pode até ser apologético mas tem de ser, primeiro, interiormente sentido, nascido duma vontade e necessidade própria sem indicações ou interferências estranhas e muito menos dirigistas. A criação cultural è um acto individualista, solitário, e não de massas. A cultura de massas foi um mito que caiu com o muro de Berlim.
Também é pela Cultura que a renúncia pode ser um poder. Pessoa levou uma vida obscura como escriturário, renunciando a qualquer notoriedade forçosa e apressada, para se dedicar solitariamente ao seu pensamento intimista esotérico. Renunciou a qualquer poder ex-cátedra para futuramente obter um poder efectivo pela obra cultural produzida e cada vez o seu poder é maior na medida em que cada vez mais gente lê, estuda, interpreta e se inspira em Pessoa. Sócrates, o antigo, renunciou à vida no exílio e preferiu a morte pela cicuta e esse gesto de renúncia acarretou-lhe mais grandeza e poder universal no mesmo sentido pessoano. A renúncia à vida pelo suicídio dum Homem de Cultura perseguido é um acto de poder e libertação pessoal face à prepotência do poder odioso oposto, tal como em Antero, Camilo e tantos outros.
Tal como Pessoa, também com Baudelaire a obra sobrepõe-se de longe à conta corrente da vida quotidiana. Condenado por imoralidade em 1857 pelo poema As Flores do Mal (tal como Flaubert por Madame Bovary), é reabilitado em 1949, 92 anos depois, com a anulação pelo Supremo Tribunal da Justiça de Paris, da sentença de 1857. Tal como Pessoa e tantos outros, hoje fazem parte do panteão dos imortais dos seus países. A maioria dos grandes Homens de Cultura o foram ou pela renúncia ou pela subversão e no seu tempo foram considerados respectivamente obscuros ou malditos. Hoje são, no seu conjunto, a nossa identidade histórica.

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